O eleitor militar
Eliane Cantanhêde
De supetão, o general
Eduardo Villas Bôas, comandante do Exército, pergunta:
– Você é a favor da
intervenção militar?
A resposta é óbvia e
rápida:
– Eu? Sou absolutamente
contra
!
E ele, com um sorriso:
– Você é? Pois eu sou mais
ainda!
É assim que as Forças
Armadas se esforçam para afastar mais esse fantasma, nesses tempos já tão conturbados
e assombrados, e tentam focar em questões mais imediatas e objetivas: fazer as
contas dos seus gastos durante as missões extras durante a greve dos
caminhoneiros, cumprir bem o mandado de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) no Rio
e se informar sobre candidatos e propostas para outubro.
Alvaro Dias, por exemplo,
já debateu com oficiais em Santa Maria (RS) e a intenção é convidar todos os
presidenciáveis bem colocados nas pesquisas para apresentar seus programas,
suas ideias e suas intenções a oficiais da Força. Sem preconceito.
O Exército já ouviu ou
está pronto a ouvir Ciro, Marina, Alckmin, Meirelles, Rabello de Castro,
Bolsonaro... E o candidato do PT? A resposta dos oficiais é rápida e dada com
naturalidade: assim que ficar definido o nome do PT, também será convidado.
As Forças Armadas, aliás,
não tiveram dificuldade com os governos civis, muito menos com Lula, que nomeou
Nelson Jobim para a Defesa, patrocinou a “Estratégia Nacional de Defesa” e
bancou os maiores programas de reaparelhamento em décadas, como os submarinos
da Marinha e os jatos da FAB anunciados já com Dilma Rousseff.
A boa relação continuou
com Dilma. Quando ela queria reclamar de alguém ou de um programa, apontava o
dedo para generais, brigadeiros e almirantes e tascava: “Vocês deveriam fazer
como os militares! Aprendam com eles!”.
Isso, claro, não significa
que oficiais das três Forças estejam animados ou mesmo dispostos a votar num
candidato do PT, qualquer que seja ele, ou de um partido nitidamente de
esquerda. Mas não é por isso que eles estão indo em massa para o lado oposto, o
de Jair Bolsonaro – primeiro nas pesquisas sem Lula.
Ao que se saiba, não há
pesquisas eleitorais nas tropas, ou seja, nas bases, mas qualquer conversa na
cúpula militar identifica que eles estão mais ou menos como a grande maioria da
população brasileira: indecisos, observando, querendo entender melhor o quadro
e quais são as alternativas que se colocam. Ou seja: estão prudentes, enquanto
líderes militares e enquanto eleitores em tempos de crise.
Basicamente, sabem que o
rombo fiscal é gigantesco, a dívida pública apavora, a violência urbana é
grave, não dá mais para cortar em saúde e educação e todos os setores vão ter
se acostumar com a ideia de que a conta será repartida. Cada um vai dar sua
cota e os militares não podem ficar de fora. Isso vale, por exemplo, para a
reforma da Previdência que, mais cedo ou mais tarde, virá.
Em conversas informais,
oficiais com grande liderança já admitem que a idade de aposentadoria é muito
baixa e que, como a população em geral, os militares também estão vivendo muito
mais e contribuindo para o desequilíbrio do sistema. Logo, eles aceitam debates
e mudanças, mas deixando bem claro que é preciso respeitar as peculiaridades de
uma carreira diferenciada, com muitas mudanças e nem sempre com carga horária
fixa.
Outra questão muito
delicada entra sutil e acessoriamente nas conversas: a Comissão da Verdade, o
pedido de desculpas oficial por torturas e desaparecimentos na ditadura e o
fato de as notícias daquele período continuarem a atormentar os militares e as
Forças Armadas.
Mas is
so não é questão
para já. Até as eleições e a posse do novo presidente, há muitas outras
prioridades já dividindo o País. Muitas questões importantes terão de esperar.
Afinal, cada dia, sua agonia.
Publicado no portal do
Jornal Estado de São Paulo em 05/06/2018