O Mago de Oz
Por Alexandre Garcia
Com quase 100 mil vidas
ceifadas, milhões de empregos estraçalhados, milhares de empresas fechadas,
dois dos três poderes têm como prioridade fake news. Como se a desgraça imposta
por esse estranho e atípico vírus fosse resolvida quando o Brasil se tornasse
blindado contra notícias falsas - a menos que haja contra as redes sociais uma
convergência de interesses comerciais com interesses políticos.
Nos meus anos de vida, a
primeira fake news de que lembro foi em janeiro de 1952 - eu tinha 11 anos -,
em O Cruzeiro, a revista de maior circulação na época. O fotógrafo Ed Keffel
fez fotos numa montagem e a revista publicou como discos voadores na Barra da
Tijuca. E vendeu muito por isso. Desde então, não cesso de ver fake news em
lugar de fatos. O estranho é que só agora o Supremo, a Câmara e o Senado
passaram a se preocupar com isso.
César Maia, pai do
presidente da Câmara, denunciou algo mais pérfido que uma notícia falsa: o
factoide. Parece fato, tem aparência de fato, é embrulhado como fato, mas serve
para "embrulhar” o leitor, o ouvinte, o telespectador. O Wall St. Journal
acaba de ter uma espécie de rebelião na redação, exigindo que notícia e opinião
venham separados, não misturados.
Fofocas e mexericos
costumam vir disfarçados de notícia. No entanto, a preocupação do Congresso e
do Supremo só visa as redes sociais, exatamente o instrumento pelo qual todos
ganharam voz, para reivindicar, desabafar, sugerir, opinar, criticar. Como se
trata de gente, não de anjos, também há ódios, mentiras, maus conselhos, ofensas.
Para esses, a própria comunidade digital tem os anticorpos: a capacidade de
pesquisar e derrubar a mentira, de responder, de boicotar, de expor o ofensor.
E as leis da democracia
também têm os remédios, o Código Penal e até a Lei de Segurança Nacional. O que
querem inventar então? A quem interessa calar opinião, restringir a liberdade
de expressão, a censura prévia, o direito de defesa, suspeitos de crime não
previsto na legislação? Fica no ar o mau cheiro da fumaça de totalitarismo. Uma
caça às bruxas, mais parecendo com um macartismo de sinal invertido
Que personagens da ficção
esses agentes da censura estariam personificando? O Big Brother, o Irmão mais
Velho, de George Orwell, que policiava até pensamento? Ou apenas o Mago de Oz,
que, atrás do biombo que o protegia, ameaçava com fogo e trovões, mas acabou
desmascarado como charlatão pela menina Dorothy?