O passado e o futuro
Por Alexandre Garcia
Em tempos de incertezas
sanitárias e políticas, tem sido muito comum a conclusão de que "sei que
estou certo e os outros estão errados”. Mas seria bom que se pensasse que
também os outros têm certeza de que estão certos e que eu estou errado. Ou seja,
cada um de nós é dono de sua própria verdade.
Existem verdades segundo o
cérebro de cada um. O sol nasceu hoje é uma verdade. Mas o sol nascerá amanhã,
já é uma verdade relativa.
Faço essa meditação de
quarentena, porque noto que além do surto do coronavírus, somos pacientes de um
surto de atividade de bolas de cristal.
O confinamento que nos
deixa mais isolados das conversas com os amigos, das palavras que nos chegam
aos ouvidos no elevador, na escada rolante, nos balcões das lojas, no ônibus,
nos deixa ouvindo apenas as nossas frases e as das redes sociais - a maior
parte com verbos no futuro. O presente já nos exauriu e saltamos em fuga
para o futuro, onde já nos contaram que haverá um “novo normal”.
Os profetas já revelaram
como será o nosso trabalho, como passaremos a jantar, como nos divertiremos.
Imagino se as pessoas que escrevem artigos sérios sobre isso, ou concedem
sérias e longas entrevistas sobre o novo normal, se estão realmente falando
sério ou se estão se divertindo com a nossa ingenuidade. Já previram que
chegará logo uma vacina e até quem vai ganhar a próxima eleição presidencial
americana.
Quanto mais Nostradamus é
o futurólogo, mais atenção passa a merecer da mídia que sente necessidade de
mudar de assunto, porque ninguém mais aguenta tanta notícia igual.
Mas o futuro real que nos
espera é o tempo presente dos desempregados, das empresas fechadas, das contas
públicas arrombadas, das novas corrupções viróticas e acusadoras perguntas que
nos esperam, sobre o passado: se tudo isso salvou vidas ou foi inútil.
No ano passado, a média
diária de mortes, segundo o Registro Civil, foi de 13.394; neste ano, baixou
para 12.559. Vamos ter um futuro de análise sobre o que passou; sobre o que
poderia ter sido feito e não foi; e sobre o que se fez e que não deveria.
Mesmo sem bola de cristal,
é possível prever que esses últimos meses serão ainda muito discutidos nos
próximos. Resta saber se teremos aprendido alguma coisa, para o futuro.