O que o brasileiro mais
quer
é que a Covid-19 vá embora
Por J.R. Guzzo
Lá se foi, enfim, o
ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta. O que estava fazendo ainda no cargo
é coisa que não sabe; há semanas ele vive em conflito aberto com o presidente
Jair Bolsonaro, e em regime presidencial ministro não pode fazer isso, e nem o
presidente pode aceitar que faça. Fim da linha, portanto.
A demora de duas ou três
semanas na demissão se deve, provavelmente, à dificuldade natural de se
encontrar um ministro da Saúde à esta altura dos acontecimentos, com o
coronavírus deitando e rolando, os meios de comunicação anunciando “mais tantos
mortos” hoje e a população, em grande parte, tomada por um medo de morrer que
nunca havia se manifestado desta forma até hoje. Quem quer segurar esse rojão?
Mas ministério, por natureza, nunca fica vazio. A pergunta é: o sucessor vai
ser melhor que o antecessor?
Essa é, no fundo, a única
questão que interessa a população. Como em geral acontece em trocas de
ministro, o cidadão não está muito preocupado com esse ou aquele nome – não é
como num time de futebol, onde cada torcedor tem o seu preferido para
centroavante ou lateral direito.
Na verdade, o público não
tem a menor ideia de quem são os doutores que estão nas manchetes; nunca soube
quem foi esse Mandetta, nem quem é Nelson Teich, seu sucessor, e amanhã já terá
esquecido de ambos. O que a população quer, mais que já quis qualquer outra
coisa nos últimos anos, é que a peste vá embora. Com A, B ou C no ministério,
tanto faz: quem tem de ir embora é o vírus.
Parece fútil, assim, ficar
tentando adivinhar se o governo “ganha” ou “perde” politicamente no episódio,
pois o que importa é como vai ser a evolução da epidemia. Também não se vai
longe com essas dúvidas quando se leva em conta que não havia outra decisão
possível, na vida real do aqui e do agora, do que demitir o ministro; não dava
para continuar vendo os dois, Bolsonaro e Mandetta, discutindo em público todo
o dia diante de uma calamidade dessas.
Ou o presidente e o seu
ministro tem a mesmíssima posição sobre como enfrentar o problema, ou um dos
dois tem de ir embora. O presidente só pode ir em 2022; então tem de sair quem
pode ir já.
Mandetta, segundo a
maioria dos julgamentos, parece ter ido bem no começo da crise. Foi elogiado, em
geral, por aliados e adversários do governo. Fez, tanto quanto se saiba, o que
um ministro podia fazer quando a epidemia chegou ao Brasil. Buscou um
equilíbrio entre a turma do “fecha tudo” e a turma da “gripezinha”. Não se
afobou, nem inventou moda e nem se inscreveu num dos dois partidos políticos
que funcionam hoje no Brasil – o PPV e o PCV, o Partido Pró Vírus, ou “da
oposição”, e o Partido Contra o Vírus, ou “do governo”.
O problema é que não deu
para continuar nessa trilha. O vírus cresceu, ficou mais forte que a prudência,
passou por cima da habilidade, moderação e outras virtudes semelhantes e levou
o ministro, inevitavelmente, a pender mais para um lado. O presidente da
República, por sua vez, pendeu para o outro. Deu nisso.
É pouco provável, no
ambiente de desordem legal, de partidarismo e de interesses criado no Brasil
por conta da Covid-19, que alguma autoridade, em qualquer nível, seja capaz de
exercer um papel realmente decisivo no combate à doença. Dentro de mais algumas
semanas vai se ver, na prática, se a situação está piorando, parou de piorar ou
começou a melhorar - não há outra possibilidade.
Nos “cenários” benignos,
os dois lados vão dizer que estavam com a razão: “Ganhamos do vírus”. No
cenário do horror, um jogará a culpa no outro, e nenhum dos dois vai ganhar
nada.