Democracia sem povo
Por Guilherme Fiuza
A resistência democrática
perdeu a paciência e resolveu falar grosso. Ela exige que o presidente da
República feche o Congresso Nacional.
Para de embromar,
Bolsonaro. Nós da resistência democrática não aguentamos mais. Já tivemos que
engolir Reforma da Previdência, Lei da Liberdade Econômica... Liberdade,
companheiro? Tá de sacanagem com a nossa cara? Que porcaria de fascismo é esse?
Quer reformar? Tudo bem.
Mas mete um decreto! Manda os militares dizerem no grito que mudou a lei e fim
de papo. Aí vocês vêm e discutem tudo democraticamente com o parlamento...
Vocês acham que ninguém tá vendo? Vocês acham que um insulto desses vai passar
batido pra nós, vigilantes incansáveis da patrulha democrática? Como fica a
imagem do Brasil lá fora? Quem vai respeitar um autoritarismo que respeita as
instituições – e ainda por cima permite que todo mundo fale o que bem entende?
A ONU, o Macron e as ONGs
já estão de saco cheio de falar de girafa. Você quer que a gente viva de quê,
Bolsonaro? Você acha que o nosso estoque de fake news é infinito? Pensa que
notícia falsa cai do céu? Não é assim não, companheiro. Isso dá trabalho. Se
coloca no lugar de uma Cassandra cansada de guerra que precisa dar dez piruetas
intelectuais e mandar ver no rebolado jornalístico pra dizer que você está
montando um ataque ao Congresso Nacional? Como a gente pode fazer o nosso
trabalho em paz com um autoritarismo frouxo desses que nos obriga a falar tudo
por ele?
Basta. Chega. Não dá mais.
O escândalo eleitoral por si só já seria suficiente pra encerrar a nossa
tolerância com esse governo. Qual era o certo pra uma candidatura fascista?
Botar as milícias pra obrigar o povo a votar no candidato fascista, correto?
Então olha o absurdo: deixaram a população votar por ela mesma! Pela própria
consciência! Diante dessa falta de manipulação escandalosa a gente foi obrigado
a inventar uma milícia de WhatsApp e anunciar que a eleição de 2018 foi o Golpe
das Tias. Olha o papelão que esse fascismo inoperante nos obrigou a fazer logo
de saída. Brincadeira.
Tudo bem, deixamos o
governo tomar posse. Demos um voto de confiança ao fascismo – com fé de que ele
não ficaria no marasmo e logo sairia arrebentando as minorias e todo mundo que
não fosse branco hétero. Outro vexame: a violência caiu em todas as faixas da
sociedade no primeiro ano de governo. Vocês têm ideia do tamanho desse trauma?
Por acaso calculam quantos humanistas de butique tiveram que se sacrificar
fazendo cara de paisagem, cerceados no seu trabalho de contar história triste e
fermentar o inimigo imaginário? Chega de dourar a pílula: o nome disso é
censura!
Mas o Bolsonaro não quis
saber e continuou afrontando as leis – mantendo no cargo todos os ministros que
a imprensa demitiu, o que configura flagrante crime de responsabilidade contra
o direito à conspiração. Como disseram os maias, molons, moluscos e parasitas
associados: quem vai parar esse fascista? Ou melhor: quem vai trocá-lo por um
fascista de verdade fantasiado de democrata, materializando enfim o fetiche da
resistência de boa aparência?
É grave a crise. Os
progressistas de auditório estão reunidos neste momento numa junta
supraparasitária para decidir quem vai de madrugada pichar umas suásticas no
Congresso – de forma que os vassalos do Lula no STF possam dar uma liminar aos
liberalóides proibindo manifestações populares. Eles garantem que assim a
democracia no Brasil estará salva.