Enem sem ideologia e sem
problemas técnicos
é mais uma vitória para
Weintraub
Pouco tempo à frente do
Ministério da Educação, Abraham Weintraub já colecionou uma série de polêmicas,
desde atritos com veículos de comunicação até a divulgação de vídeos irônicos
contra a doutrinação de esquerda, Paulo Freire, a UNE, Dilma Rousseff, Luiz
Inácio Lula da Silva, sem contar performances questionáveis como a imitação de
Elvis Presley ao final de uma coletiva de imprensa. Mas uma coisa é certa: o
economista brigão tem colecionado vitórias nesses quase sete meses na pasta e o
Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) 2019 é, sem dúvida, a segunda mais
importante do ano – depois do fim do “contingenciamento de recursos”.
A primeira prova do exame
– a mais susceptível à “doutrinação” pelos temas de linguagens e ciências
humanas –, realizada neste domingo (3), ocorreu sem o “terrorismo” propagado
nos últimos meses, utilizando o termo do próprio Weintraub. Não houve os
problemas de impressão superdimensionados – alguns críticos ao governo chegaram
a dizer que não haveria Enem em 2019 – e nem contratempos técnicos de peso. A
prova também custou menos do que nos anos anteriores. O fato mais grave
registrado neste domingo foi a difusão por Whatsapp de uma fotografia da prova,
logo após o início do exame, feita por um dos 350 mil aplicadores contratados pelo
Inep, mas que não trouxe consequências aos estudantes – todos já estavam
na avaliação, sem acesso ao celular, quando a imagem circulou pelas redes
sociais.
“Foi um sucesso”,
comemorou o ministro, em coletiva de imprensa. “A despeito de ficar seis meses
debaixo da chuva de fake news. Foi o [Enem] com o menor custo por aluno (...) e
foi o mais baixo aparentemente em termos de problemas”, continuou.
“Além disso”, afirmou, “este ano, respeitamos
toda a
sociedade, ao contrário dos outros anos (...)
ao contrário do que tinha no
passado, doutrinação,
sujeira, ineficiência, escândalo, problemas com
gráfica...”
A prova não trouxe temas
como o feminismo, os LGBTs ou a ditadura militar. Por outro lado, não fugiu de
assuntos como o totalitarismo, sob a ótica de Hannah Arendt, questões sobre os
direitos humanos, quilombos, intolerância religiosa, entre outros, até com um
número maior de questões de sociologia, ao contrário do que era esperado.
Apareceram autores como Michel Foucault, Kant, Maquiavel, René Descartes, Adam
Smith e Jacques Derrida. O tema da redação foi “Democratização do acesso ao
cinema no Brasil". Nem a esquerda está criticando a prova”, disse
Weintraub.
Perguntado por que a
“ditadura militar” não foi citada na prova, Weintraub repetiu que não sabia do
conteúdo do Enem até o início da prova, mas que orientou que o conteúdo pudesse
“beneficiar os alunos mais preparados”.
“As nossas orientações para o time que compôs, e isso
a gente fez, era para que fizesse uma prova onde fosse
possível selecionar as
pessoas mais qualificadas
para conseguir entrar na faculdade. O objetivo do
Enem
não é dividir nem polemizar, nem doutrinar, o objetivo
do Enem é
selecionar as pessoas mais capacitadas.
E eu acho que foi plenamente atendido”.
A grande vitória do ano
A narrativa de ameaças ao
Enem 2019 que acabou desmentida neste domingo pode ser comparada à que
acompanhou a dos bloqueios realizados no orçamento da Educação, principalmente
nas universidades federais – do qual, queira-se ou não, Weintraub saiu
vencedor.
Quando, para equilibrar as
contas, o governo contingenciou o orçamento das universidades, sindicatos foram
às ruas dizendo que o governo estava fazendo cortes no orçamento. Weintraub fez
vídeos explicando que contingenciar não é cortar, mas não funcionou, professores
fizeram paralisações, ameaçaram entrar em greve e estudantes foram às ruas.
No fim, porém, o MEC
conseguiu descontingenciar todo o orçamento das universidades federais e as
manifestações feitas durante o ano ficaram sem sentido. As palavras do início
do ano do ministro ao dizer que “não é corte, mas sim contingenciamento” se
fizeram realidade – e não o propagado pelos sindicalistas nas ruas.
A próxima grande batalha
de Weintraub será a tentativa de implantação do Future-se, o programa do
governo que pretende aumentar os recursos para universidades federais,
principalmente por meio de parcerias com a iniciativa privada. Uma lista de
universidades se resiste a participar do programa – que ainda não saiu do papel
– com medo de “perder a autonomia” ou se “prostituir com o mercado”. Outras, na
contramão do viés de esquerda, já se manifestaram positivamente à iniciativa.
Só o tempo dirá qual narrativa será vencedora e, caso o Future-se seja
implantado, se Weintraub tinha razão ou não. Por ora, goste-se ou não do perfil
do ministro, ele já tem muito a comemorar.
Números
Dos 5,1 milhões de
inscritos para o Enem 2019, 76,9% participaram do exame, 3,9 milhões – uma
abstenção de 23,1%, ou 1,2 milhão de pessoas. Dos que fizeram a prova, 376
foram eliminados por não respeitar algum dos critérios dispostos pelo edital.
Fonte: Gazeta do Povo