Sergio Moro e os senadores
Os senadores da Comissão
de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado submeteram o ministro da Justiça,
Sergio Moro, a uma maratona de cerca de nove horas, em que o ex-juiz federal
foi questionado pelos senadores a respeito das supostas conversas publicadas pelo
site The Intercept Brasil, que vem divulgando textos atribuídos a trocas de
mensagens entre Moro e o procurador da República Deltan Dallagnol. Como em um
debate eleitoral, havia até mesmo réplica e tréplica, e o ministro saiu-se bem,
mantendo a tranquilidade e defendendo seu trabalho durante os anos que passou à
frente da Operação Lava Jato.
Houve, evidentemente,
momentos de elevação da temperatura, especialmente da parte dos parlamentares
petistas, interessados em desmoralizar Moro e guiados por uma lógica muito
peculiar, segundo a qual uma hipotética falha de conduta da parte do então juiz
e do procurador levaria à conclusão de que o ex-presidente e hoje presidiário
Lula não cometeu nenhum dos crimes pelos quais ele já foi condenado em três
instâncias da Justiça. Humberto Costa (PT-PE) chegou a exigir que Moro
renunciasse ao cargo e “pedisse desculpas ao povo brasileiro” por ter lhe
tirado o direito de votar em Lula – o disparate foi tamanho que Moro optou por
se recusar a responder. Outro petista, o sergipano Rogério Carvalho, foi além e
chegou a insinuar que Moro havia pago R$ 170 mil a uma empresa de media
training, com o objetivo de prepará-lo para a ida à CCJ, merecendo resposta
dura do ministro – praticamente o único momento em que Moro agiu de forma mais
enfática. E não faltaram, sempre vindas da oposição, as comparações entre as
denúncias do Intercept e a divulgação das interceptações telefônicas de Lula,
em 2016, ignorando as óbvias diferenças entre uma ação criminosa de um hacker e
um grampo autorizado pela Justiça e cujo conteúdo foi divulgado por ordem
judicial.
Moro soube escapar dos
truques da
oposição e defender sua atuação
Quando as perguntas
tiveram por objetivo realmente buscar esclarecimentos a respeito das supostas
conversas, em vez de simplesmente tirar Moro do sério, o ministro respondeu
sempre guiado por algumas linhas principais. Uma delas foi o respeito à decisão
do Intercept de publicar as conversas, em consonância com a liberdade de
imprensa. Mas Moro também fez questão de criticar a maneira como o site vem
tratando o caso, seja por não ter oferecido até agora qualquer evidência de que
as conversas são verdadeiras, seja pelo que o ministro chamou de
“sensacionalismo”, em que as conclusões tiradas pelo Intercept não derivam do
texto exato das conversas – o caso mais recente é o dos supostos diálogos sobre
uma investigação contra o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, assunto que
não estava nas mãos nem de Moro, nem de Dallagnol, mas que foi divulgado como
indício de uma combinação para preservar o tucano.
O ministro fez questão de
defender a lisura de seu trabalho diante da Lava Jato e, sem admitir a
veracidade das mensagens, ressaltou que as práticas que aparecem nos supostos
diálogos não têm nada de ilegal ou que possa causar prejuízo aos julgamentos em
andamento ou concluídos. “Eu recebi advogados em minha sala. Conversávamos
informalmente. Não é adiantamento de decisão, não é conselho, mas uma
interlocução normal em qualquer fórum de Justiça. O dado objetivo é que não há
nenhuma espécie de conluio”, disse, lembrando que não conversava apenas com os
procuradores. “Não tem nenhum aconselhamento, apenas uma interlocução”,
acrescentou, lembrando que o diálogo com partes envolvidas nos processos são
prática corrente e legal, como aliás já afirmaram diversos juristas.
É evidente que, para os
detratores da Lava Jato e defensores do “Lula livre”, nada do que Moro tivesse
dito na CCJ os levaria a mudar de opinião. Mesmo antes que o Intercept
publicasse os supostos diálogos, já estava consolidada, para essas pessoas, a
narrativa que faz da Lava Jato uma enorme conspiração para colocar um inocente
Lula na cadeia e prejudicar o PT. Moro soube escapar dos truques da oposição e
defender sua atuação, enquanto ressaltou dúvidas pertinentes a respeito das
supostas conversas e sua divulgação.
Gazeta do Povo – 20.06.2019