Há uma campanha aberta
contra a Lava-Jato
A Segunda Turma do Supremo
Tribunal Federal aceitou denúncia do Ministério Público, tornando réus três deputados
federais e um senador do partido Progressistas (PP). Acusação: desvio de R$ 390
milhões no esquema do petrolão, portanto, mais um caso descoberto pela
força-tarefa da Lava-Jato.
A decisão do STF,
apertada, por três votos a dois, saiu na última terça-feira, 11 de junho de
2019. Pois o inquérito vem desde março de 2015.
A história é bem conhecida
e começa com Paulo Roberto Costa, um dos primeiros operadores do petrolão a
serem apanhados. Delatou, contou que era o representante do PP na diretoria da
Petrobras, detalhou o esquema de desvio de dinheiro para ele mesmo e para
políticos. Foi o primeiro delator da operação, chamado então de “delator
bomba”, isso em 2014.
Foi preso, condenado,
cumpriu parte da pena em Curitiba, passou para a domiciliar, está em casa.
Enquanto isso, os
políticos denunciados, que têm o foro privilegiado, continuam no exercício do
mandato e só agora tornaram-se réus.
Nessa mesma parte da
história, tem um político já condenado, o ex-deputado Nelson Meurer, do PP, a
uma pena de prisão de mais de 13 anos. Foi o primeiro parlamentar condenado
pelo Supremo no âmbito da Operação Lava-Jato. E ainda está livre, graças aos
inúmeros recursos no próprio STF.
Portanto, os quatro
parlamentares, que se tornaram réus na última terça-feira, têm, claro, motivo
de preocupação, mas não é uma sangria desatada. E quase escaparam. Dos cinco
magistrados da Turma, dois votaram contra a denúncia, os ministros Gilmar
Mendes e Ricardo Lewandowski. Para aceitar a denúncia, votaram Edson Fachin,
Cármen Lúcia e o decano Celso de Mello.
É brutal a divergência dos
votos. Gilmar Mendes disse que a denúncia do Ministério Público, e originária
da Lava-Jato, era um amontoado de argumentos soltos e vazios. E foi para cima
de Sergio Moro.
Já Celso de Mello,
conhecido pelos seus votos longos, cuidadosos e detalhados, entendeu que a
denúncia envolvia a atuação de “políticos que parecem desconhecer a República”.
Considerou que o MP construiu um bom caso, com indícios relevantes de prática
de crime.
Como esses dois votos
podem ser tão distantes? Simples: o decano argumentou como magistrado. Já
Gilmar Mendes simplesmente está em campanha para derrubar a Lava-Jato e o que
chama de “Direito Penal de Curitiba”.
Eis o ponto. A Lava-Jato
inovou na investigação, sempre coordenada, envolvendo Ministério Público,
Polícia Federal, Receita Federal, Coaf e outros órgãos, utilizou instrumentos
contemporâneos, como a delação premiada, e introduziu interpretações jurídicas.
Tudo isso permitiu caracterizar e punir os crimes de corrupção, lavagem de
dinheiro e formação de quadrilha entre políticos e empresários.
Ou seja, o “Direito Penal
de Curitiba” descobriu e apanhou um monstruoso assalto ao Estado que vinha
sendo praticado há muitos e muitos anos.
O outro Direito Penal, o
velho, o da corte brasiliense, simplesmente não viu nada disso.
Onde o velho Direito,
chamado garantista, via “simples caixa dois”, uma simples infração eleitoral, o
novo descobriu lavagem de dinheiro.
Um exemplo entre tantos.
A mudança começou no
mensalão. Mas ninguém saberia o tamanho da corrupção sem a Lava-Jato.
Tudo isso para dizer que
há, sim, uma campanha aberta contra a Lava-Jato. Fazem parte os corruptos já
descobertos e os que temem ser apanhados; os políticos que estavam acostumados
a se servir do poder; a esquerda que quer livrar Lula, o comandante da operação
toda; a direita que quer a farra de volta.
E também estão nesse esforço
advogados, por razões óbvias, e juízes. Por que juízes? Porque para muitos
deles a Lava-Jato é a prova viva de quantos crimes deixaram passar ou não
quiseram ver.
A divulgação das conversas
Moro/Dallagnol faz parte disso. E o que tem ali é, sim, uma certa coordenação
formal de trabalho. Legítima.
Não republicanas são as
relações entre magistrados, advogados, políticos e réus, mantidas a festas e
jantares e viagens na corte brasiliense.
E o pessoal do site
Intercept não faz jornalismo. É pura militância.
Carlos Alberto Sardenberg
O Globo