Se as instituições não
funcionam, não é culpa das redes sociais
Eu vi as imagens de uma
menina, em um grupo de alunos, recusar o cumprimento do presidente Bolsonaro.
Era o que a notícia dizia, mas depois eu vi a mesma imagem com o áudio, aí a
gente ouvia o presidente perguntando e fazendo gesto com a mão apontando para
as crianças: “Você é Palmeiras? Você é Palmeiras? Você é Palmeiras?”.
Aí ele apontou para a
menina, estendeu o braço apontando para ela perguntando: “Você é Palmeiras?” e
a menina fez não com a cabeça. Isso acabou sendo notícia muito divulgada –
“criança recusa cumprimento”.
Fizeram até pesquisa para
mostrar que uma vez uma criança também estava de braço cruzado com o presidente
Figueiredo. E não era nada disso: era pura fake news.
Essas coisas me deixam
envergonhado como jornalista. Quando a gente esquece que já acabou a eleição –
e que a gente entrou fazendo campanha contra, apresentando Bolsonaro como um
ogro. E agora a criança está recusando cumprimentá-lo. A gente não aceita que
nós fizemos campanha contra ele e fomos derrotados. Nas redes sociais esses
desmentidos vêm logo.
Democracia via redes
sociais
Nunca o indivíduo teve
tanta força política como hoje, graças às redes sociais. Ainda que elas tenham
seus defeitos e seus vícios – mas a democracia também tem defeitos e vícios.
Parece que a democracia
está sendo mais bem exercida pelas redes sociais, porque o indivíduo pode ter
sua página, seu site, seu canal, o seu WhatsApp e se comunica direto com seu
vereador, seu deputado, com seu senador, seu prefeito, seu governador e seu
presidente. Reclama e critica.
Aí vão dizer o que? Que as
instituições não estão funcionando? Se não estiverem funcionando não é culpa da
rede social, não – é culpa de quem está operando essas instituições:
Legislativo, Judiciário e Executivo se desentendendo. É isso que a gente tem
que considerar.
Percival Puggina, que é um
colunista muito bom, identificou que nunca na história se exerceu a democracia
de forma tão próxima, tão corpo a corpo, graças ao mundo digital.
E o Tiradentes?
Aliás é bom a gente
considerar outra coisa: o que o Brasil está fazendo para se aproveitar do mundo
digital além de fofoca em rede social. Porque Estados Unidos e China estão
tratando de biotecnologia, biociência, robótica, biomedicina e inteligência artificial.
O mundo hoje é movido pelo
conhecimento, quem tem conhecimento tem poder. Aí eu fico me perguntando: e
nós? Onde é que nós estamos? Nós estamos fazendo alguma coisa? Nossa
produtividade está lá embaixo; a política é movida a vaidades; as elites
estatais dos poderes de estados ficam se segurando para não perder privilégios,
como a reforma da Previdência pretende tirar; há a burocracia e os impostos que
trancam tudo.
Vejam só, a gente acaba de
comemorar o Tiradentes. Ele fez o quê? O que desencadeou a Inconfidência
Mineira? Foi cobrar um quinto sobre o ouro que saía daqui, que é 20%. Hoje a
carga tributária é quase o dobro disso. São coisas que vão trancando o país, trancando
o emprego, o investimento, o progresso.
O que o Brasil precisa é
de conhecimento. Eu vou repetir isso aqui sempre.
As tais 11 varas
O Supremo neste momento
está metido em uma camisa de 11 varas. Eu pensei que o pessoal conhecesse a
expressão, mas já que muita gente não conhece eu vou explicar: camisa de 11
varas era uma medida de um pano em que se enrolavam condenados. Vara era uma
medida inglesa usada no Brasil colonial.
O Supremo está metido
nessa camisa de força. Como é que vai sair dessa? Inventou um inquérito em que
o próprio queixoso é quem investiga, denuncia, julga e multa. Ou seja, é quem
aplica a lei, é o carrasco. É um negócio absurdo com base no regimento interno
do Supremo.
Agora os grandes juristas
estão mostrando que o sujeito de um inquérito é o Ministério Público. Se o
Ministério Público não tomou a iniciativa não existe inquérito. O Supremo vai
ter que engolir isso. Foi o próprio presidente do Supremo quem detonou essa
história.
Na Ucrânia e aqui, rir é
melhor
Para encerrar, eu queria
registrar que um país da importância da Ucrânia elegeu presidente um comediante
de 41 anos, com mais de 70% dos votos. É um senhor feito. Eu fico pensando aqui
no Brasil no Danilo Gentili, com quem eu vou estar na noite desta segunda-feira
(22), no programa The Noite do SBT.
Esse vencedor da eleição é
ator de cinema, teatro e televisão. Eu já vi muita gente chegar a cargos
eletivos por essa mesma via. Aí eu me reporto ao teatro da Roma Antiga que
tinha um lema: ridendo castigat mores. Fazendo uma tradução livre, seria:
é rindo que a gente critica o poder.
Alexandre Garcia
Gazeta do Povo