No começo da noite de
quarta-feira (7), o Senado jogou mais uma bomba no colo da equipe econômica do
presidente eleito, Jair Bolsonaro, ao aprovar projeto que reajusta os salários
dos ministros do Supremo Tribunal Federal. Graças ao voto de 41 senadores, os
magistrados passarão a receber R$ 39,2 mil, contra os R$ 33,7 mil atuais. O
mesmo reajuste foi concedido ao cargo de procurador-geral da República, hoje
ocupado por Raquel Dodge – mas, neste caso, a votação foi simbólica, em que o
presidente da casa apenas pede aos favoráveis ao projeto “que permaneçam como
estão”, para quase que imediatamente proclamar o resultado, antes que alguém
ouse não permanecer como está.
O projeto que reajusta os
vencimentos dos ministros tinha sido enviado ao Congresso em 2015, quando o
presidente do Supremo era Ricardo Lewandowski. Tinha sido aprovado na Câmara em
2016 e parou no Senado, até porque Cármen Lúcia, que sucedeu Lewandowski no
comando do STF, nunca foi favorável aos reajustes. Demonstrando um bom senso
raro entre membros dos três poderes quando o tema é o uso do dinheiro do
contribuinte, ela sempre defendeu que, em tempos de crise, cabia também aos
ministros dar sua cota de sacrifício pelo equilíbrio fiscal. Mas, em agosto
deste ano, ela foi voto vencido quando o plenário da corte resolveu que era
hora de pleitear o aumento.
"O aumento cria um
efeito-cascata, já que a remuneração de vários outros cargos, não apenas na
magistratura, é atrelada aos vencimentos dos ministros do Supremo. Além disso,
há outros servidores que serão beneficiados: aqueles cuja soma de salário e
gratificações ultrapassava os R$ 33,7 mil e, por isso, tinham seu contracheque
limitado a esse valor. Agora, esses servidores poderão receber mais, até o novo
limite de R$ 39,2 mil. A conta? R$ 4 bilhões em 2019, segundo as assessorias da
Câmara e do Senado, divididas entre a União e os estados. Uma
irresponsabilidade no momento em que o governo federal acumula déficits de
dezenas de bilhões de reais, e diversos estados estão em situação fiscal
desesperadora.
Mas o acinte não fica
apenas nos valores e no momento em que são aprovados. Muito pior é ver que
houve praticamente uma negociata aberta entre o Supremo, o Congresso e o
presidente Michel Temer. A diferença entre o salário atual e o aprovado, R$ 4,5
mil, é quase idêntico ao auxílio-moradia que hoje é pago a todos os magistrados
do Brasil, em flagrante violação à Constituição. Pelo acordo costurado entre os
poderes, se o Senado aprovasse o reajuste, o Supremo finalmente acabaria com o
benefício, seja votando as ações que o ministro Luiz Fux convenientemente
segurou em seu gabinete por anos, após ter instituído a farra por meio de
liminar, seja por meio de um projeto de iniciativa do Judiciário enviado ao
Congresso. Ou seja, o reajuste não passa de um meio de legalizar um pagamento
que era inconstitucional e tinha sido instituído como uma maneira torta de
compensar a falta de reposições salariais ao longo dos anos – algo que as
próprias associações de magistrados reconhecem abertamente, em uma triste
página da história do Judiciário nacional em que o corporativismo prevaleceu
sobre o interesse público.
O correto seria simplesmente
negar o aumento e acabar de vez com o auxílio-moradia, mas isso exigiria uma
coragem que, no momento, anda rara em Brasília. O projeto aprovado pelo Senado
está agora na mesa do presidente Michel Temer, que, tendo sido um dos
negociadores do acordo com o Supremo, muito provavelmente irá sancioná-lo. Se
realmente o fizer, o presidente que já vê a porta de saída do Planalto
colaborará para dificultar o trabalho de seu sucessor e apresentará um desfecho
decepcionante para um mandato que começou sob o signo do ajuste fiscal.
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