Os dois Brasis
Eliane Cantanhêde
Ao empurrar a eleição para dois
candidatos que representam os extremos, a polarização do processo político
também divide claramente o Brasil, com a esquerda cada vez mais consolidada no
Nordeste (27% do total do eleitorado) e a direita impondo-se no Sul (15%), com
reflexo direto na eleição para a Presidência e para os governos estaduais.
Jair Bolsonaro (PSL) disparou
em todas as regiões e chega a 37% no Sul e a 36% no Centro-Oeste, dois
arraigados redutos da direita. Ratinho Júnior (PSD) no Paraná, Ronaldo Caiado
(DEM) em Goiás e Mauro Carlesse (PHS) em Tocantins têm forte chances de vitória
para seus governos já no primeiro turno.
No Nordeste, a situação se
inverte. Fernando
Haddad (PT) já lidera e, apesar da crise de Dilma Rousseff, que
afetou diretamente os Estados, cinco dos governadores têm grandes chances de se
reeleger no primeiro turno. Três são do PT: Rui Costa (BA), Camilo Santana (CE)
e Wellington Dias (PI). O quarto é Flávio Dino (MA), do PCdoB. E o campeão é
Renan Filho (AL), do MDB, com apoio do PT e de Lula.
Vão-se criando assim dois
Brasis. Um se alinha com o discurso da bala, da segurança, da antipolítica, do
antipetismo e do conservadorismo de costumes. O outro é grato às benesses
sociais, suscetível às promessas populistas, desconhece a importância do
equilíbrio fiscal, acha natural o aparelhamento do Estado e releva a pregação
contra a corrupção.
No Sudeste, com 43% do
eleitorado e as três maiores economias do País – São Paulo, Rio e Minas –,
Bolsonaro já atinge 30%. Com a decisão do governador Paulo Hartung de não
disputar a reeleição, Renato Casagrande (PSB) pode se eleger em primeiro turno
no Espírito Santo, um exemplo de gestão, mas no resto tem de tudo, inclusive
surpresas.
Bolsonaro engole os
vestígios de esquerda no Rio, onde Eduardo Paes (DEM) lidera para o governo, e
também a hegemonia do PSDB em São Paulo, onde João Doria empata
com Paulo Skaf
(MDB) e Geraldo
Alckmin não deslancha para a Presidência.
Outra surpresa é a divisão
em Minas. O tucano Antonio Anastasia tem posição confortável para voltar ao
governo e a petista Dilma está à frente para o Senado, dois anos depois do
impeachment e de manter os direitos políticos graças, por exemplo, a Renan Calheiros,
regiamente recompensado hoje na eleição do filho para o governo e da sua
própria para o Senado em Alagoas.
Aliás, o MDB do
presidente Michel Temer está
bem na foto eleitoral, apesar de o partido ser um dos mais atingidos pelas
prisões da Lava Jato e de Temer ser imbatível em impopularidade. Além de Renan
Filho, candidato a campeão de votos no País, também Helder Barbalho pode se
eleger em primeiro turno no Pará. Vem a ser filho de Jader Barbalho, outro
ex-presidente do Senado bem enrolado na Justiça.
Tem-se, portanto, a
direita solidamente no Sul e no Centro-Oeste e a esquerda definitivamente no
populoso Nordeste, com o Norte mantendo hegemonias familiares e o Sudeste numa
barafunda. A única coisa inquestionável é que Jair Bolsonaro, apesar de tudo, e
de todos os riscos, lidera com folga em quatro das cinco regiões do País e nos
Estados mais populosos. Isso tem cheiro de Fernando Collor em 1989, mas o PT
também tem suas armas (eleitorais, frise-se).
Resta saber que tipo de
movimento, ou de reação, começa a se desenhar com o manifesto de
alerta de Fernando Henrique Cardoso, endossado por intelectuais
tucanos. O Brasil está dividido entre a direita bolsonariana e a esquerda
petista. O que isso projeta para o futuro? E vai ficar por isso mesmo? Ainda
teremos muitos solavancos durante as eleições, mas principalmente depois.
Apertem os cintos!
Portal Estadão – 23/09/2018