Bolsonaro pelas bordas
Eliane Cantanhêde
A Região Sudeste, com seus
43,4% dos votos, é uma incógnita, com São Paulo dividido, Rio uma bagunça e
Minas, imprevisível. O Sul briga com sua tradição tucana, o Nordeste espera a
ordem unida do ex-presidente Lula e Norte e Centro-Oeste podem dar soma zero:
cada um tem em torno de 7,5% de votos e eles se compensam, ou se anulam.
Com 33 milhões de
eleitores, São Paulo já começa com duas surpresas. Governado pelo PSDB há 25
anos e respirando sem aparelhos, enquanto Rio, Minas, Rio Grande do Sul e Rio
Grande do Norte afundam, o Estado está dando uma canseira nos tucanos: empate
técnico de Jair Bolsonaro (PSL) com Geraldo Alckmin para a Presidência e de
Paulo Skaf (MDB) com João Doria para o Bandeirantes.
Eleição após eleição, a
campanha sempre começa com o discurso da “fadiga de material” dos tucanos em
São Paulo, mas eles acabam ganhando. Na última vez, para a Prefeitura da
capital (9 milhões de eleitores), com um troféu: apadrinhado por Alckmin, Doria
ganhou em primeiro turno.
E agora? A tal “fadiga de
material” deixou de ser só lenga-lenga? E pode até estar sendo ampliada pelo
surgimento de Bolsonaro? Ele não é “novo”, depois de 27 anos de Congresso e com
a filharada toda na política, mas se contrapõe a nomes considerados óbvios,
como o próprio Alckmin, Marina Silva e Ciro Gomes, além de se colocar como o
maior adversário do PT
.
No caso de Doria, contam
os acertos e a perseverança de Skaf, que construiu na Fiesp boa plataforma para
o governo, na capital e no interior. E contam os erros e a precipitação de
Doria, que, mal assumiu a principal prefeitura do País, saiu em campo tentando
disputar a candidatura presidencial com Alckmin e, no fim, trocou o mandato
pela eleição ao governo. O “povo” não esquece essas coisas facilmente.
No Rio, tudo pode
acontecer e o melhor exemplo foi Marcelo Crivella, da Igreja Universal do Reino
de Deus, contra Marcelo Freixo, do PSOL – ¬ extrema-direita versus a
extrema-esquerda para a prefeitura. Estado destruído, MDB desmontado, o
ex-governador Sérgio Cabral na cadeia por bom tempo e, mesmo não sendo “chapa
militar”, Bolsonaro deve colher votos de militares da reserva, fortes no Rio,
enquanto o ex-prefeito Eduardo Paes (ex-DEM, ex-MDB, novamente DEM) tem fôlego
para o governo.
E Minas? O ex-governador
Antonio Anastasia está conseguindo se desvencilhar da forte ligação com Aécio
Neves (agora candidato à Câmara) e lidera para o governo, mas a ex-presidente
Dilma Rousseff não só manteve a elegibilidade como tenta usar o impeachment a
seu favor para o Senado. PSDB lidera para o governo, PT para o Senado, enquanto
Bolsonaro vai se afirmando no Estado e lucrando com a briga renhida entre PT e
PSDB.
O Nordeste, com 26,6% do
eleitorado, é Lula, tanto que os adversários do PT desistiram de dar tiro
n’água com vice nordestino. A dúvida é se, com tão pouco tempo, basta Lula
estalar os dedos para todo mundo votar em Fernando Haddad. Será? A esta altura,
a região conhece Bolsonaro, mas não faz ideia de quem é esse tal Haddad. Como
no Norte (7,8% dos votos).
Com 14,5% dos eleitores, o
Sul costumava equilibrar o lulismo do Nordeste com uma tendência para o PSDB,
como no Centro-Oeste (7,3%). Desta vez, há Alvaro Dias (Podemos) tirando
casquinha dos problemas tucanos e Bolsonaro comendo pelas bordas.
A polaridade PT-PSDB, que
dividia o País entre Nordeste e Sul, mudou muito de figura, com Bolsonaro
enraizado no Sudeste, no Sul e no Centro-Oeste e ainda na expectativa de lucrar
uns bons votinhos petistas no Nordeste e no Norte quando a Justiça Eleitoral
acabar com a candidatura fake de Lula. Eleição não é razão. A razão só chega
depois, quando o eleito tira a fantasia de candidato para governar. Acaba a
festa, fica o medo.
Portal Estadão, em
14/08/2018