Coxinhas
e mortadelas juntos
O partido do senador Fernando Collor, o PTC, fez aliança com o Podemos
para apoiar a candidatura presidencial de Alvaro Dias. Em Alagoas, Collor é
candidato a governador e tem como seu vice o vereador Kelmann Vieira, do PSDB,
do tucano Geraldo Alckmin.
No Ceará, o PT descartou o senador José Pimentel, intenso militante, que
queria tentar a reeleição, e deu seu lugar na chapa para o “golpista” Eunício
Oliveira, do “traidor” MDB. Assim, o governador petista Camilo Santana tem
ampla aliança na sua campanha pela reeleição. A outra vaga ao Senado ficou para
Cid Gomes, do PDT, irmão de Ciro, que acaba de ser fritado pelo PT.
O PP está no centrão, portanto na chapa de Geraldo Alckmin. Mas o
presidente do PP, Ciro Nogueira, já avisou que lá no Piauí é Lula e não abre.
Não sendo Lula candidato, bom, será preciso outra conversa, não é mesmo?
A gente que está fora da prática política estranha. As alianças federais
e estaduais não têm o menor conteúdo ideológico. Os cabeças de chave ainda
apresentam programas — até são obrigados a isso. Mas os coadjuvantes das chapas
não precisam. Não falam de programa, mas de governo, quer dizer, de
participação no futuro governo.
Em resumo, a gente diz: não tem a menor lógica. Mas tem, sim. E até se
pode dizer que é uma lógica econômica — a de eliminar ou reduzir a concorrência
para obter controle do mercado.
Imagine que o petista Camilo Santana se recusasse a formar chapa com os
“golpistas” que derrubaram Dilma. O MDB e o PDT seriam obrigados a formar suas
próprias chapas, com candidatos a governador e senador. Ampliava-se assim a
concorrência eleitoral, o que, aliás, daria mais opções ao consumidor, quer
dizer, eleitor.
Mas concorrência é boa para o consumidor. As empresas gostam mesmo é de
uma boa reserva de mercado e/ou monopólios.
Assim, na política. Fazendo aquelas amplas alianças, os caras reduzem ou
eliminam a concorrência, controlam o mercado eleitoral e garantem suas
eleições.
Simples, não?
Os bobos somos nós. O que achamos estranho, para eles é absolutamente
normal.
Tira o dinheiro
Aliás, esse conceito de normal está espalhado.
Por exemplo: tem muito assalto a banco pelas cidades do interior remoto.
Com a polícia praticamente inexistente, fica fácil para bandidos da capital
fazer um tour por algumas localidades e levar o dinheiro das agências.
De tanto acontecer, virou normal. Até que bancos — sobretudo o BB e o
Bradesco — que têm mais capilaridade, encontraram uma solução simples. O que os
bandidos querem? Dinheiro vivo. Logo, tirando dinheiro vivo das agências
desaparece o objeto do roubo, e acabou-se o problema.
Sucesso. Todo mundo ficou sabendo que não tinha mais papel moeda por
aquelas cidades do interior.
E os aposentados, a maioria recebendo um salário mínimo, e acostumados a
pegar o dinheiro vivo?
Paciência. Que paguem suas contas pelo meio eletrônico. Muitos não se
dão bem com essas coisas. Além disso, e o dinheirinho do dia a dia?
Paciência, virem-se.
O pessoal se vira: por exemplo, as pessoas entram na fila do banco e
ficam esperando aparecer alguém que pague uma conta em dinheiro. Aí entra algum
no caixa, o funcionário chama o primeiro da fila e paga o que der. Ou então os
aposentados vão receber em agências de cidades maiores.
Ficou assim, normal: agência bancária sem dinheiro.
Tira o bronze
Outra: tem muito roubo nos cemitérios municipais de São Paulo. Com o
policiamento praticamente inexistente — devem achar que os caras já morreram
mesmo — fica fácil para a bandidagem fazer um tour pelas alamedas e levar as
peças artísticas dos túmulos e todo o material nobre (como cobre).
Virou normal.
Até que os usuários, ou os parentes de usuários, encontraram solução
simples: em vez de cobre, registrar os nomes e datas em placas de latão ou
acrílico. Em vez de colocar peças decorativas valiosas, chamar um bom
grafiteiro. Pintura, ninguém leva, óbvio.
Como? Mais policiamento? Bobagem, já está resolvido.
Em tempo: não tem nada disso nos cemitérios privados.
Portal O Globo em 09/08/2017