A volta de quem não foi
Eliane Cantanhêde
O anúncio da candidatura
de Dilma Rousseff ao Senado por Minas Gerais é duplamente, digamos, curioso.
Ela, como Lula, é tecnicamente inelegível. E como vai defender o seu legado na
Presidência da República durante a campanha?
Quem esqueceu de como
Dilma manteve a possibilidade de disputar eleições, apesar do impeachment? No
último segundo do segundo tempo, os então presidentes do Senado, Renan
Calheiros, e do Supremo, Ricardo Lewandowski, fizeram um acordão e inventaram a
novidade.
Pela letra fria das leis e
da Constituição, presidente da República que sofre impeachment se torna
automaticamente inelegível durante oito anos, como ocorreu com Fernando Collor
de Mello, e ninguém jamais questionou. Ele cumpriu pacientemente sua quarentena,
antes voltar à política com mandato de senador.
Collor era Collor, o
inimigo número um da Nação, que na reta final não tinha mais aliados, só
adversários. Já Dilma tinha por trás o padrinho Lula e o PT, um dos maiores
partidos do País, então com 13 anos de Presidência. Por causa de Lula e do
partido, Renan e Lewandowski deram um jeitinho e Dilma manteve o direito de se
candidatar.
Dilma nasceu em Minas, mas
fez carreira política no Rio Grande do Sul e praticamente estabeleceu
residência no Rio de Janeiro. Como vai fazer campanha em Minas, um dos três
Estados mais importantes e mais politizados? Vai defender o seu próprio legado,
desastroso? Ou o do governador Fernando Pimentel, seu amigão, que enfrenta
problemas na Justiça e encerra o mandato com uma baita crise econômica, até
atraso de salários de funcionários?
Apesar da tese de “golpe”,
Dilma caiu por inapetência política, inaptidão administrativa e erros crassos
na economia. Afundou o Brasil em dois dolorosos anos de recessão econômica;
inflação acima da meta; juros estratosféricos; fundos de pensão depenados;
agências desarticuladas; estatais sem prumo; setor elétrico de pernas para o
ar; pré-sal condenado a ficar para sempre nas profundezas do oceano.
Foi assim que o País
mergulhou no desemprego. Hoje, são 13 milhões de desempregados e precisa-se
reconhecer que Michel Temer não conseguiu controlá-lo, mas a culpada número um
foi Dilma, sua autossuficiência, suas noções antiquadas de economia, sua
incapacidade de entender a importância dos pilares macroeconômicos. “Coisa da
direita...”, diria ela.
A eleição em Minas,
portanto, parece ir de mal a pior. Dilma disputando o Senado como revanche pelo
impeachment e seu contendor no segundo turno de 2014, Aécio Neves, do PSDB,
pior ainda: sem ter para onde correr. Presidência de novo? Governo de novo?
Senado de novo? Nem perto. Se der sorte, pode até encontrar uma vaga de
deputado federal, mas sem ilusões: mandato não é mais garantia de foro
privilegiado. Nem de impunidade.
Já confuso desde 2016, o
politizado eleitor mineiro acabou levando à prefeitura de Belo Horizonte o
verdadeiro outsider daquela eleição, Alexandre Kalil, do inexpressivo PHS. E
esse é o maior risco da eleição presidencial no Estado este ano.
Para o governo, o PT
aposta na reeleição de Pimentel e o PSDB foi buscar o ex-governador Antonio
Anastasia, que encerrou a primeira gestão bem avaliado e passa ao largo das
infindáveis descobertas da Lava Jato. Por fora, corre o ex-prefeito de BH
Marcio Lacerda (PSB), que aguarda articulações de seu partido com o PDT de Ciro
Gomes.
O pior em Minas é a
eleição para a Presidência. Com o Norte e o Nordeste petistas e o Sul e o
Centro-Oeste antipetistas, Minas é um Estado-chave para definir o sucessor de
Temer. Se mantiver o “espírito do contra” que levou Kalil para a prefeitura,
vocês sabem quem vai se dar bem, não é? Ou já está se dando...
Publicado no portal do Jornal
Estado de São Paulo em 03/07/2018