A sensatez e o radicalismo
Na terça-feira passada foi
lançado em Brasília o manifesto Por um Polo Democrático e Reformista, que
defende a união do centro político como uma maneira de viabilizar
eleitoralmente uma candidatura presidencial comprometida com as reformas de que
o País tanto precisa. Elaborado por 30 políticos e intelectuais de vários
partidos – PSDB, MDB, PSD, PPS, PV e PTB –, o conteúdo do documento foi
antecipado pelo Estado no mês passado.
“O manifesto é um chamado
à consciência sobre a gravidade do momento atual e sobre as consequências
profundas e duradouras que terão nossas ações e inações”, disse o ex-presidente
Fernando Henrique Cardoso, em mensagem lida durante o lançamento. Entre as
medidas propostas, o documento lista a reforma da Previdência, com adoção de um
sistema único para servidores e trabalhadores da iniciativa privada, e a
tributária, sem aumento de impostos. Propõe ainda a recuperação do caráter
educacional do programa Bolsa Família.
Diante da atual situação
do País, trata-se de uma iniciativa de grande relevância. Há grandes desafios
que o próximo governo terá de enfrentar, como, por exemplo, o déficit
previdenciário e a crise fiscal, e é imprescindível que os partidos minimamente
comprometidos com o interesse público congreguem esforços em torno de um candidato
responsável, que esteja distante das promessas populistas e, ao mesmo tempo,
conquiste o eleitorado.
Apesar de sua importância,
o lançamento do manifesto não foi especialmente concorrido. Por exemplo, nenhum
pré-candidato presidencial compareceu ao evento. É, sem dúvida, uma pena, pois
poucas vezes na história política do País a sensatez e o compromisso foram tão
necessários como agora.
Nestes tempos esquisitos,
o que parece brilhar é justamente a atitude oposta, de quem deseja aparecer no
cenário político com propostas demagógicas e radicais. O radicalismo de alguns
políticos esconde uma enorme contradição. Dizem-se muito decididos a enfrentar
os problemas nacionais, mas na realidade ficam apenas na superfície, com
propostas simplistas para problemas complexos.
É o que faz, por exemplo,
o deputado federal Jair Bolsonaro (PSC-RJ). No seu périplo pelo País, o sr.
Bolsonaro apresenta-se como o único pré-candidato ao Palácio do Planalto
realmente decidido a combater as graves questões de segurança pública. Suas
propostas para o tema, no entanto, resumem-se a um discurso de confronto e
violência, com a promessa de armar a população.
Em tese, uma atuação
nesses moldes deveria desacorçoar o eleitorado, pois evidencia um profundo
desconhecimento do pré-candidato em relação ao tema. Ou, o que seria pior, que
o conhece, mas prefere ignorar sua complexidade com o que estaria exposta
deliberada intenção de engabelar o público.
É urgente que o poder
público, em todas as esferas, atue com mais determinação no combate à violência
urbana e rural., No entanto, esse trabalho de resgate da lei e da ordem vai
muito além de munir o cidadão com armas. Apenas para citar alguns exemplos, um
novo patamar de segurança pública envolve cuidado com as fronteiras, melhor
coordenação entre a União e os Estados – que são os responsáveis diretos pela
segurança pública –, políticas adequadas para os presídios, um Poder Judiciário
mais diligente, com o encerramento dos processos em tempo razoável.
Quem deseja se qualificar
para concorrer à Presidência da República tem o dever de abordar, sem
simplismos, as questões nacionais. Suas propostas devem conter, ao menos, a
descrição de políticas factíveis e que enfrentem as causas dos problemas.
De certa forma, a
disjuntiva que o eleitor terá de enfrentar na urna no dia da eleição – entre
competência e responsabilidade, de um lado, e populismo e radicalismo, de outro
– é desde agora apresentada aos partidos e aos políticos. Ainda que a sensatez
e a racionalidade pareçam brilhar tão pouco, em contraste com alguns
radicalismos, o País necessita urgentemente dessas qualidades. E é isso o que
uma candidatura comprometida com o interesse público, sabendo entusiasmar e
cativar o cidadão, deve expressar.
Publicado no portal do
Jornal Estado de São Paulo em 09/06/2018