Políticos no paredão
O eleitor terá a oportunidade de fazer a grande renovação
na política no ano que vem
João Domingos
Sem que a intenção fosse essa, o Judiciário, o Ministério
Público e a Polícia Federal fizeram mais do que uma reforma política no Brasil
nos últimos anos. No fundo, com suas decisões, investigações e ações, eles
levantaram uma espécie de paredão, no qual fuzilaram a carreira de dezenas de
políticos tradicionais que por muito tempo dominaram a cena no País.
Nessa reforma às avessas, Judiciário, MP e PF decretaram
o fim do sonho dos tucanos Aécio Neves e José Serra de se tornar presidente da
República, inviabilizaram a candidatura do ministro Blairo Maggi (Agricultura),
que estava sendo trabalhada pelo PP, e podem ter acabado com a tentativa do
ex-presidente Lula de voltar ao Palácio do Planalto.
Uns, como Aécio, Serra e Maggi, porque as candidaturas
deles a presidente se tornaram inviáveis depois de terem os nomes envolvidos em
escândalos. Outros, como Lula, porque também se envolveram em escândalos e
correm o risco de condenação em segunda instância, o que os tornaria
inelegíveis, por se tornarem fichas-sujas.
Um projeto de lei que tratasse de uma reforma política e
eleitoral não teria o alcance que tiveram as decisões e ações do Judiciário, MP
e PF, mesmo que ficasse no Congresso por décadas e lá fosse melhorado ano a
ano.
O certo é que hoje, a não ser que aconteça um milagre, e
eles não podem ser descartados, estão fora da vida política num curto prazo
nomes como o do presidente Michel Temer, dos ministros Moreira Franco e Eliseu
Padilha, dos ex-presidentes da Câmara Henrique Eduardo Alves e Eduardo Cunha,
dos ex-ministros José Dirceu e Antonio Palocci. Não só porque uns estão presos,
outros condenados, outros denunciados, mas porque dificilmente o eleitor
votaria neles para que voltassem a ocupar os cargos eletivos que já
ocuparam.
Além das ações que envolveram investigações, prisões,
denúncias e condenações, uma decisão do STF que proibiu o financiamento
empresarial de campanha também foi fundamental nessa reforma política
impensada.
Quem é que imagina, hoje, a JBS dos irmãos Joesley e
Wesley Batista como a maior doadora de uma campanha eleitoral? Pois de 2005 a
2014, período em que a JBS obteve cerca de R$ 2,5 bilhões do BNDES, a empresa
repassou a candidatos e partidos políticos um total de R$ 463,4 milhões em
valores declarados. Ou cerca de 18,5% de tudo o que recebeu do banco de
fomento.
Essa reforma política feita na marra só foi possível
porque o próprio Congresso aprovou, em 2013, a lei que definiu o que é
organização criminosa e possibilitou o uso do instituto da delação premiada,
seguindo uma tendência mundial de aperfeiçoamento da legislação penal. Em 2010
fora aprovada a Lei da Ficha Limpa, que passou a punir com a inelegibilidade
candidatos condenados por órgãos colegiados, a exemplo dos tribunais regionais
federais e tribunais de Justiça, mais os tribunais superiores.
Olhando-se para o passado recente, a impressão que fica é
de que deputados e senadores, que fizeram as leis que hoje se tornaram como que
um paredão para eles, não pensaram quando as votaram. Ou, se pensaram, acharam
que estavam protegidos pela impunidade, pelo poder que exerciam, pelo conluio
das instituições na construção de uma rede de proteção a eles. Porque, como se
vê hoje, quatro anos depois da aprovação da lei da delação premiada, parece que
muitos nem perceberam que ela poderia alcançá-los.
A próxima eleição, que ocorrerá daqui a pouco mais de um
ano, oferecerá ao eleitor um quadro de candidatos já bastante limpo. Caberá ao
eleitor aproveitar a oportunidade e buscar a renovação, uma renovação que
reduza o fisiologismo, o toma lá dá cá, que se volte para o cidadão.
*Publicado no Portal Estadão em 16/09/2017