PT não sabe o que fazer com Dilma
Um ano depois do afastamento, presidente cassada vira
problema
dentro do partido; candidatura ao Senado ou Câmara é
cogitada
Um ano depois do impeachment, a presidente cassada Dilma
Rousseff é vista por setores amplos do PT como uma página a ser virada. Embora
o discurso oficial seja de martirização de Dilma e a militância apoie a
ex-presidente, alas petistas a consideram culpada pela derrocada do partido e
uma ameaça para a volta de Luiz Inácio Lula da Silva ao Palácio do Planalto.
Segundo estes setores do partido, a falta de controle de
Dilma sobre a Polícia Federal – e não os casos de corrupção envolvendo
integrantes da legenda – resultou na Lava Jato, no impeachment e na
disseminação do sentimento antipetista.
Por outro lado, estes mesmos setores consideram que as
maiores dificuldades para o retorno de Lula à Presidência são reverter o
entendimento comum de que os erros de Dilma são a origem da crise econômica e
recompor a aliança de centro esquerda esfacelada no processo de impeachment.
O partido não sabe o que fazer com Dilma. Hoje, as
funções da presidente cassada se resumem à presidência do conselho curador da
Fundação Perseu Abramo, muito longe do centro de poder real da sigla.
Na semana passada, a presidente nacional do PT, senadora
Gleisi Hoffmann, ex-ministra e uma das petistas mais próximas e fiéis a Dilma,
perguntou à presidente cassada se ela pretende se candidatar em 2018.
“Ela disse que não tem nada decidido. Mas, se decidir se
candidatar, vai ter muito voto”, disse a senadora. Para Gleisi, “Dilma é a
grande liderança que encarna a injustiça contra o PT”.
No entanto, a opinião da presidente do partido não é
compartilhada por setores relevantes da máquina partidária. Em conversas
reservadas, dirigentes dizem que, se Dilma for derrotada na disputa por uma
cadeira no Senado pelo Rio Grande do Sul ou pelo Rio, causaria mais desgaste ao
PT. Outros afirmam que ela tiraria a vaga de um senador petista e aceitam, no
máximo, uma candidatura a deputado federal.
As críticas, antes veladas, agora vieram à tona. O
próprio Lula, em entrevista à uma rádio de Salvador, apontou falhas de Dilma na
condução da política e da economia e disse que ela poderia ter tomado a decisão
de não se candidatar à reeleição.
O presidente estadual do PT do Rio, Washington Quaquá,
escreveu que, com a chegada de Dilma ao Planalto, “uma arrogância desmedida
tomou conta do centro de decisões”.
Em conversas recentes com amigos, Dilma demonstra falta
de vontade de voltar a morar a Brasília, ficar presa a um mandato e ter de
conviver com políticos que considera traidores.
Ela prefere a agenda de viagens internacionais nas quais
denuncia o que chama de “golpe” e a convivência com intelectuais e artistas. No
início de setembro, ela volta à Europa para um giro que inclui França, Bélgica,
Itália e talvez a Rússia. Desta vez, além de “denunciar” o impeachment, vai
fazer a defesa do direito de Lula de disputar a eleição de 2018.
A relação com o ex-presidente continua “inabalável”.
Ambos conversam com frequência e se encontram quando possível. Defender Lula é
uma das prioridades de Dilma. Na véspera da morte de seu ex-marido Carlos
Araújo, ela foi ao Rio para o lançamento de um livro de juristas contra a
condenação do petista pelo juiz Sérgio Moro, embora Araújo estivesse
hospitalizado. A tristeza causada pela morte do ex-companheiro foi notada por
amigos.
Dilma só demonstra incômodo com as agendas intermináveis
do antecessor. Semana passada, confrontada com roteiro da caravana de Lula no
Nordeste, capitulou: “Meu filho, não tenho mais saúde para essas coisas”.
Ela passa os dias entre Porto Alegre, Rio e Belo
Horizonte, onde mora sua mãe. Mantém a rotina de pedaladas matinais e, à medida
que as reações hostis diminuíram, tem gostado mais da relação direta com o
povo. Ela vive da aposentadoria de R$ 5 mil, investimentos e aluguéis de
imóveis da família.
Pouco tempo atrás teve oportunidade de comprar o
apartamento vizinho ao seu, em Porto Alegre, mas recusou a oferta para não
dispor dos R$ 1,2 mil mensais da taxa de condomínio.
Agência Estado