O dia ‘D’*
Eliane Cantanhêde
Vença ou não o impeachment – que
chega a este domingo como tendência, apesar de tremeliques de última hora –,
Dilma Rousseff, Lula e o PT são os grandes derrotados desse processo, que tem
uma longa história, desde virar as costas a Tancredo, à Constituinte, a Itamar,
ao Plano Real, com um ponto comum em todos esses momentos: o “nós” contra
“eles”. Enfim, a realidade se impõe novamente: o “nós” é minoria, o “eles” é a
maioria. A maioria da sociedade cansou da arrogância e da beligerância dessa
minoria.
Apesar de o governo martelar dentro e
fora do País a versão do “golpe”, não foi a oposição (muito menos o PSDB) que
articulou o impeachment, redigiu e assinou o pedido de abertura, mobilizou
milhões de brasileiros nas ruas, explodiu a base aliada. Em paralelo ao
poderoso processo de inclusão social dos anos Lula, os responsáveis por tudo o
que se está vendo e vivendo foram Dilma, Lula e o PT.
A presidente, pela incompetência, o
destempero e a incrível capacidade de destruir a economia nacional. Lula, por
se sentir Deus e dono do País, tomar de assalto a máquina, as estatais, os
fundos de pensão e adotar a rotina da provocação à maioria que está em todas as
classes de renda e em todas as regiões, estuda, trabalha, mora, produz, compra,
vende. O PT, por jogar fora suas bandeiras e sua história pelo poder efêmero,
esbaldando-se com adversários históricos e de passado duvidoso, incapaz de
cobrar coerência e até decência do seu grande líder.
Na reta final do processo de
impeachment, Dilma teve uma mãozinha de governadores camaradas, recebeu o
diretor da OEA e reverteu um voto daqui, outro dali, mas os erros demonstram
temor: a ida ao Supremo, a decisão e o recuo do pronunciamento pela TV,
martelar que Michel Temer acabará com a Bolsa Família (repetição barata do bordão
“o PSDB vai privatizar a Petrobrás”, de 2006). Por fim, a ida de Lula ao
acampamento do MST. Para quem fala em “união nacional”...
Se conseguir os votos mínimos (1/3 da
Câmara) para se segurar na cadeira, Dilma chega ao terceiro mandato como um
fantasma, incapaz de incorporar uma presidente capaz de articular um pacto,
arregimentar forças políticas, econômicos e sociais para reformas e para
recuperar as contas públicas e a economia nacional. O mercado vai desandar. A
crise vai explodir. Ela mantém o mandato, mas perde a Presidência para Lula –
até onde a Lava Jato e a Zelotes permitirem.
Se der impeachment, Dilma vira mesmo
“carta fora do baralho”. Nem PT, PC do B, PSOL e PDT vão bater à sua porta,
acenar com uma volta por cima. Se não der, ela insistirá que lutará “até o
último minuto”, mas faltarão ouvidos, tropas, armas. Hoje é o dia “D” do
impeachment. Se não passar, acabou. Se passar, dificilmente o Senado
desautorizará a Câmara, até porque a votação para acatar o pedido é por maioria
simples e ninguém considera a hipótese de o plenário trazer Dilma de volta
depois de 180 dias fora. Aí, Inês é morta, Dilma também. Quanto a seu legado, a
história se encarregará de contar.
A história, porém, não acaba aí.
Estará só começando, com as forças políticas se reaglutinando, o PT e seus
movimentos discutindo um plano de ação, os agentes econômicos pedindo pressa,
os trabalhadores apreensivos, o mundo olhando de esgueira para o Brasil. Tempos
difíceis para o Brasil e para Temer.
Se ele assumir, terá de mostrar a que
veio e até onde vai, com a obrigação de se livrar de Eduardo Cunha na primeira
hora. É do jogo e o próprio Eduardo Cunha, um jogador, sabe que é assim. Como
resume realisticamente o deputado Jarbas Vasconcelos, um governo do PMDB tem
chance zero. Temer só terá chance com um governo de união. O grito de guerra de
muitos que votam hoje no impeachment é “Fora Dilma, Fora Cunha”, para começar
do zero. Mas falta o
*Publicado no portal Estadão.com, em 17/04/2016