'Doa a quem doer'
Eliane Cantanhêde
13 Setembro 2015
O sr. e a senhora acham que a semana passada foi de
arrepiar? Pois se preparem para esta semana, que não vai ser muito diferente. O
ex-presidente Lula está sendo sugado para o centro da Lava Jato, a presidente
Dilma Rousseff debate-se aflitivamente sem sair do redemoinho e o grupo
suprapartidário pró-impeachment tenta transformar a ventania em tufão.
O Planalto segue a orientação do PMDB e acena com um
pacote de corte de gastos, extinção de ministérios e sugestões para aumentar a
receita, para mostrar que o governo está vivo, tem coesão e, se não há metas,
há planos e vontade. Parecer é mais importante do que haver. Então, vale a
definição de Dilma: não tem meta, mas, quando atingir a meta, o governo vai
dobrar essa meta.
Ministros menos cotados e/ou de pastas periféricas estão
suando frio. Apesar de não terem recebido, até o fim do expediente de sexta-feira,
nenhum telefonema da presidente ou pedido de algum colega político para
arrumarem as gavetas, eles sabem que alguém tem de pagar o pato das contas que
Dilma estragou. Não seria Aloizio Mercadante, não é mesmo?
Mercadante é para Dilma como a reforma política é para
qualquer governo.
Toda vez que explode uma confusão, os governos correm para
dizer que, agora, a reforma política vai. Toda vez que o mandato de Dilma
balança, Lula, o PT, o PMDB e a Esplanada dos Ministérios juram que, agora,
Mercadante cai.
Assim como a reforma política nunca vem, o governo continua
balançando, o ministro continua balançando e nada muda na Casa Civil. Quando
mudar, poderá ser tarde demais.
Como é preciso mostrar que a presidente preside e o
governo governa, troca-se a cabeça de um Mercadante pelo corte de ministérios,
um confeito do bolo que tem mais efeito moral e estético do que prático e
efetivo nas contas públicas. A sério, precisa passar a tesoura até no saco de
bondades que Dilma brandiu na campanha eleitoral.
Ela não pode se furtar a isso, por três motivos: sem
equilíbrio fiscal, nem a economia nem a política saem do buraco; as contas têm
de fechar, queiram ou não Lula, o PT e os movimentos alinhados ao partido; o
PMDB bateu pé e o corte é precondição para Levy, Barbosa e Mercadante
empurrarem o aumento de impostos para o Congresso. Mesmo assim, sem
garantias...
Do outro lado, a semana da oposição promete. O
abaixo-assinado pró-impeachment é um sucesso, já há até um passo a passo
impresso de como afastar a presidente e a decisão do TCU sobre as contas de
Dilma em 2014 está para sair. Até lá, o deputado Eduardo Cunha ensaia o script
com as oposições: vai recusar a maioria dos pedidos, deixar o do ex-ícone
petista Hélio Bicudo à mão e aguardar a senha do TCU para o plenário dar
prosseguimento ao processo. A ideia é tirar do Planalto e de seus aliados o
discurso de que há “um golpe das elites” ou é “coisa pessoal” de Cunha.
O pedido da PF para Lula depor confere ainda mais
dramaticidade ao enredo, pois a argumentação do delegado Josélio Azevedo de
Sousa não é absurda. Segundo ele, Lula “pode ter sido beneficiado pelo esquema
da Petrobrás, obtendo vantagens para si, para seu partido, o PT, ou mesmo para
seu governo, com a manutenção de uma base de apoio partidário sustentada à
custa de negócios ilícitos”. Milhões de pessoas têm a mesma suspeita desde o
mensalão, reforçada agora com o petrolão.
E ninguém pode alegar que foi pego de surpresa. Em
entrevista ao Estado, em 4 de julho, o diretor-geral da PF, Leandro
Daiello, avisou à população, ao seu público interno e aos poderosos que, mesmo
que as investigações chegassem à presidente e a Lula, nada mudaria na Lava
Jato: “Nós investigamos fatos, não pessoas. Aonde os fatos vão chegar é
consequência da investigação, doa a quem doer”. Falou e está cumprindo. Aliás,
diferentemente de quem fala muito e não resolve nada.
Metamorfose. Surge um novo personagem em Brasília, o
“Serrinha paz e amor”. Aí tem!
Publicado no portal do jornal O Estado de São Paulo