Com os nervos à
flor da pele
O ESTADO DE
S.PAULO
11 Dezembro 2014
Diante das sobejas evidências que se
acumulam em torno do escândalo da Petrobrás, é - mais que compreensível -
perfeitamente adequado que em ato público relativo ao Dia Internacional de
Combate à Corrupção, realizado na manhã de terça-feira em Brasília, o
procurador-geral da República, Rodrigo Janot, tenha feito um duro
pronunciamento. Lamentou ele que "o Brasil ainda seja um país extremamente
corrupto", que "envergonha-nos estar onde estamos" e, em
consequência disso, "esperam-se as reformulações cabíveis, inclusive, sem
expiar ou imputar previamente culpa, a eventual substituição" da diretoria
da estatal.
É também compreensível - mas, para
dizer o mínimo, definitivamente inadequado - que a presidente Dilma Rousseff
tenha subido nas tamancas, classificado a manifestação do procurador-geral de
"escândalo", instruído assessores a anunciar sua "irritação"
com o episódio e ordenado ao ministro da Justiça que voltasse a fazer, dessa
vez com maior competência do que já havia tentado na presença de Janot, um
categórico repúdio à ideia de afastamento de Graça Foster do comando da
Petrobrás.
É compreensível, como foi dito, que
incomode a Dilma a evidência de que os fatos conspiram contra sua intenção de
se exibir como campeã da moralidade pública e inimiga implacável da corrupção.
"Tenho uma vida inteira que demonstra o meu repúdio à corrupção",
proclama texto inserido com destaque na página oficial da presidente no
Facebook. Mas, para um chefe de governo, "repudiar" a corrupção não é
suficiente.
A nação brasileira, ela sim muito
"irritada" com o "escândalo" verdadeiro, que é o assalto à
maior estatal brasileira, exige a identificação e responsabilização dos
culpados, desde o mais modesto operador do esquema até a mais alta autoridade
envolvida na esbórnia, seja por cumplicidade, seja por incompetência para
evitá-la.
E é certamente por aí que a coisa
pega: a apuração das responsabilidades em todos os níveis da hierarquia do
poder público. É fácil mandar para a cadeia um empresário corrupto. Mas quando
se trata do poder público, quanto mais alto se posiciona o hierarca, mais bem
blindado ele estará contra a suspeita de desvios de conduta. Recorde-se a
facilidade inicial com que Dilma Rousseff, já presidente da República, afastou
de Dilma Rousseff, presidente do Conselho de Administração da Petrobrás, a
responsabilidade pela controvertida compra da Refinaria de Pasadena, atribuindo-a
a informações "incompletas" de um relatório técnico.
Até algumas semanas atrás Dilma era
candidata à reeleição e, conforme sua própria escala de valores, sentia-se no
direito de fazer "o diabo" para se manter no poder. Por exemplo,
fingir que a Operação Lava Jato era coisa pouca, manipulada pela oposição. Mas
a eleição já acabou e agora são as investigações da Polícia Federal que estão
no centro da cena política nacional.
Assim, se na opinião de Rodrigo
Janot, que tanto abalou os nervos de Dilma Rousseff, o Brasil está
"convulsionado" com o episódio que "como um incêndio de largas
proporções" corrói "as riquezas da nação", está mais do que na
hora de a própria presidente da República passar das palavras aos atos e demonstrar
que está de fato disposta a manter "tolerância zero" com os
malfeitos, "doa a quem doer". E o afastamento preventivo da diretoria
da Petrobrás, como sugere o procurador-geral da República, pode cumprir uma
dupla função: remover eventuais dificuldades na apuração dos fatos e demonstrar
que Dilma faz o que precisa ser feito, doa a quem doer. Afinal, se a amiga
Graça Foster não está envolvida nos malfeitos - além da responsabilidade
administrativa e política que tem qualquer administrador de recursos públicos
-, a justiça será feita e ela poderá ser reinvestida na presidência da estatal.
Se a presidente Dilma Rousseff
permanecer irredutível na tentativa de blindar a diretoria da estatal, estará
estimulando as suspeitas sobre as suas próprias responsabilidades no escândalo
da Petrobrás, em cuja gestão interferiu decisivamente nos últimos 10 anos.