Editorial da
edição de hoje (27) do jornal O Estado de São Paulo, tratando de ação da
Polícia Federal que, atendendo denúncia, inspecionou o avião de campanha do
senador Edison Lobão Filho, candidato ao governo do Maranhão.
O PMDB acode o
clã Sarney
O ESTADO DE
S.PAULO
27 Setembro 2014
Os distraídos decerto não se deram
conta, mas a República correu grave risco na madrugada da quinta-feira. Pelo
menos é o que se poderia deduzir dos estridentes pronunciamentos com que o
vice-presidente Michel Temer e o seu companheiro de caciquia no PMDB, o
presidente do Senado Renan Calheiros, reagiram a um obscuro episódio ocorrido a
altas horas no aeroporto maranhense de Imperatriz, a cerca de 500 quilômetros
da capital São Luís. Ao que parece, uma equipe da Polícia Federal (PF),
mobilizada a partir de uma suposta denúncia anônima e chefiada pelo delegado
regional do órgão, invadiu um avião de campanha do senador Edison Lobão Filho,
candidato ao governo do Estado - pelo PMDB, claro.
Alegadamente de armas em punho, os
federais revistaram o aparelho, os carros e a bagagem da comitiva do suplente
de senador que exerce o mandato desde que seu pai, o titular da cadeira, se
licenciou para ocupar o Ministério de Minas e Energia. A propósito, ao que se
divulgou semanas atrás, o nome do genitor teria sido citado pelo ex-diretor de
abastecimento da Petrobrás Paulo Roberto Costa entre os envolvidos no festival
de corrupção na área da estatal que o delator comandava. Desde então, o
ministro não tem sido visto em Brasília. Em Imperatriz, os federais estariam
atrás de dinheiro de caixa 2 da candidatura de Lobão Filho. A diligência deu em
nada e os policiais se retiraram, deixando como encontraram os bens
vistoriados.
Nada nem remotamente parecido,
portanto, com os devastadores resultados de outra incursão da PF em terreno
politicamente minado no Maranhão. Em 1.º de abril de 2002, agentes do órgão
acharam e apreenderam R$ 1,34 milhão em dinheiro vivo no escritório do marido e
sócio da então governadora Roseana Sarney, filha do oligarca nascido José
Ribamar Ferreira de Araújo Costa. O escândalo acabou com as pretensões de
Roseana de conquistar a cadeira que já foi do pai, no Palácio do Planalto. Mas
não impediu que no mesmo ano ela se elegesse senadora, juntamente com uma cria
da família, Edison Lobão. O clã serviu fielmente ao regime militar, mas para o
PT de Lula e de Dilma isso são águas passadas.
O ainda senador Sarney, de 84 anos, e
a atual governadora Roseana, 61, não participarão mais de disputas eleitorais.
O futuro do soba, de qualquer forma, estará em causa no pleito próximo. Ele
corre o risco de sofrer uma rara derrota se as urnas confirmarem a dianteira do
adversário histórico do clã, o ex-presidente da Embratur e ex-deputado federal
Flávio Dino, do PC do B. Ele aparece nas pesquisas com 42% de intenções de voto
ante 30% de Lobão Filho. Daí, quem sabe, o teor desproporcional ao incidente
das notas emitidas por Temer e Renan sobre o que teria sido a
instrumentalização de forças policiais para "atingir candidaturas
legitimamente constituídas", no dizer do vice-presidente, como se a
legitimidade das aspirações de Lobão Filho estivesse em dúvida.
De seu lado, o titular do Senado
advertiu que as instituições não podem "descambar para a exploração
político-partidária". De fato, não podem, mas, pelo seu retrospecto
amplamente conhecido, Renan Calheiros está longe de ser a figura pública mais
credenciada a invocar esse princípio.
A indignação ostentada por ambos em face
de uma ocorrência de dimensões afinal restritas - embora, ainda assim, precise
ser plenamente esclarecida, como promete o Ministério da Justiça - contrasta
com a indiferença dos aliados e agregados do clã Sarney diante da baixaria
cometida contra o oposicionista Flávio Dino, numa tentativa, que se revelaria
aloprada, de favorecer a candidatura de Lobão Filho, mediante falso testemunho.
Um presidiário do notório complexo
penal de Pedrinhas, em São Luís, revelou que foi induzido por duas autoridades
do setor, com a promessa de receber uma paga e regalias na cadeia, a gravar um
vídeo acusando o candidato do PC do B de ligações com o crime organizado. Os
maranhenses não merecem o que a oligarquia Sarney faz há décadas do Estado,
enquanto os priva do acesso a serviços públicos minimamente aceitáveis. O
Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do Maranhão é o segundo pior do País. É
a obra de um sistema de poder.