sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

Artigo

O cucaracha preconceituoso

André Machado*

Bastariam apenas os insultos racistas contra o volante Tinga em jogo da Libertadores da América para que o odioso preconceito nos revoltasse. Como se não bastasse no mesmo dia as redes sociais fazem circular um vídeo onde um parlamentar brasileiro diz que quilombolas, indígenas, gays e lésbicas são “tudo que não presta”. E como a emenda é sempre pior que o soneto, o deputado Luiz Carlos Heinze (PP-RS) justificou-se ontem em Zero Hora tratando as minorias por “estas coisas” e alega não ter nada contra “bichas”. Só faltou chamar lésbica de “sapatão”.
O vídeo que desnuda a essência de um parlamentar reflete o preconceito que se repete em muitos lares brasileiros. Quem trata minorias como “coisas ruins” também costuma divertir-se com piadas que discriminam e fazem rir os falsos “quatrocentões” brasileiros que imaginam-se “WASPs norte-americanos: brancos anglo-saxões. Não o são.
Somos latinos e isto já basta para sermos olhados de jeito atravessado em boa parte do mundo setentrional. E somos latinos-americanos. Somos ”cucarachas”  e ainda nos sentimos no direito de ter preconceito contra alguém? O que tem que ser abominada é a falta de justiça social, a desigualdade, o determinismo, o autoritarismo, a violência. Não o ser humano.
O pensamento do deputado Heinze lembra muito as falas do personagem de Antônio Fagundes na novela Amor à Vida. Ao descobrir que o filho era gay, o médico reconhecido afirmava categoricamente “não ter preconceito”, mas vociferava que “filho meu tem que ser macho”. É o pior preconceito, aquele que se disfarça em tolerância.
Há poucos dias ouvi uma pérola em uma padaria do bairro Menino Deus, em Porto Alegre. O cliente dizia à proprietária do estabelecimento que “iria dar uma de negrão”. Fiquei pensando na dimensão da expressão. Certamente ele não se referia a submeter-se a salários inferiores ao dos brancos ou em ver a sua juventude exterminada pela luta do tráfico no país. Ele certamente nada sabe sobre preconceito e discriminação e imagina-se apenas “bem-humorado”.
Esta, aliás, é uma desculpa frequente entre os preconceituosos. Acusam os que denunciam a discriminação como pessoas de mau humor. Ou alguém que lê este artigo nunca falou “programa de índio” ao referir-se a algo chato? Não se trata do Império do Politicamente Correto, mas do respeito ao ser humano do jeito que ele é. Gostaria que o deputado Heinze refletisse a respeito.
* Jornalista


Morte do cinegrafista

Acusado cita partidos
O auxiliar de limpeza Caio Silva de Souza, de 22 anos, preso pela morte do cinegrafista Santiago Andrade, reafirmou em depoimento formal à polícia que participou de protestos "de forma remunerada". Embora não acuse formalmente ninguém, disse acreditar "que os partidos que levam bandeiras (aos atos) são os mesmos que pagam os manifestantes" e citou PSOL, PSTU, a Frente Independente Popular (FIP) e a ativista Elisa Quadros, a Sininho.
Sobre Sininho, Caio disse ter visto "um papel onde a contabilidade do dinheiro distribuído era feita", que "apareceu no Facebook". O papel a que se refere é uma planilha de prestação de contas que relaciona Sininho a 11 pessoas, incluindo dois vereadores, um delegado e um juiz.
A lista elenca doadores que contribuíram para o "Mais Amor, Menos Capital", evento cultural promovido em 23 de dezembro pelo grupo Ocupa Câmara, para o qual ela pediu doações. Durante o ato não houve confronto nem vandalismo. A doação foi totalmente legal.
Segundo a planilha, o grupo arrecadou R$ 1.690 de 11 doadores, entre eles os vereadores do PSOL Renato Cinco, que doou R$ 300, e Jefferson Moura, que doou R$ 400, além do delegado Orlando Zaccone, que contribuiu com R$ 200. Um juiz identificado como Damaceno teria doado R$ 100.
Em um dos convites, o Ocupa Câmara anuncia que iria "comemorar o fim de ano com debates, apresentações artísticas e solidariedade para os sem-teto e vítimas das enchentes". A programação incluiu oficinas, debates e um ato ecumênico, além de shows musicais.
Os vereadores e o delegado confirmam as doações - no caso de Jefferson Moura, que estava em viagem, a iniciativa partiu de funcionários de seu gabinete. Todos ressaltam, porém, que nunca contribuíram para qualquer ato de grupos violentos, mas para um evento pacífico, em que não houve qualquer ocorrência policial.(Agência Estado)