Urbanismo equivocado:
um elemento para insegurança.
AdeliSell*
Nos dias que correm, uma das grandes preocupações das pessoas é,
sem dúvida, o problema da segurança urbana. Muitos acreditam que um posto
policial por si só é garantia de uma vida mais tranquila. Ledo engano. É certo
que a insegurança aumentou em nossas cidades, mas não apenas pelo crescimento
do consumo de drogas, como o crack, uma das calamidades mais alarmantes, ou
pela desigualdade social e econômica. A violência urbana cresceu especialmente
em decorrência da péssima arquitetura das grandes cidades, das calçadas mal
conservadas e do urbanismo equivocado.
Questões estas que os governantes e os empreendedores fazem
questão de não discutir. Sabem que este modelo exclui de todas as formas.
Quanto mais carros, avenidas amplas e edifícios altos, mais lados sombrios e
iluminação inadequada, logo uma cidade menos segura.
Não é de hoje que estudiosos do urbano, especialmente
arquitetos, vem se debruçando sobre o assunto e dando contribuições valiosas
para o seu enfrentamento. Por isso, é interessante explorar quais fatores
espaciais podem contribuir para diminuir a violência.
Jane Jacob já defendia décadas atrás a presença de desconhecidos
como importante. Ela também acreditava que a manutenção da segurança não é
feita apenas pela polícia, mas pela rede intrincada de controles e padrões de
comportamento espontâneos presentes em meio ao próprio povo e por ele
aplicados. Ou seja, espaços onde o morador é o olheiro e o comerciante conhece
as pessoas do entorno são um atestado de que ali fica mais difícil um meliante
aprontar alguma ou um abusador atacar uma estudante na calada da noite.
Cidades com calçadas amplas também desempenham papel fundamental
para a manutenção da segurança. Explico por que. As próprias pessoas que usam e
transitam pela rua acabam exercendo uma vigilância natural. Ruas desertas
dificilmente atrairão a atenção de quem está dentro das edificações, o que
acaba acentuando a sensação de insegurança. Vou além. Calçada mal cuidada não
só atrapalha quem caminha, mas impede o sujeito de olhar a vitrine, apreciar
uma bela arquitetura ou cumprimentar alguém no café. Um passeio público
descuidado faz com que as pequenas distâncias, como uma ida à padaria ou à
farmácia, sejam percorridas de carro, e não mais a pé como antigamente.
Observe, reflita, isto acontece.
Esquinas com obstáculos tipo "fradinhos" para carros
não subirem na calçada são o maior absurdo, atrapalham, tiram a atenção das
pessoas, dificultam a vida dos idosos e cadeirantes. Um banco de praça
quebrado, sujo, sem pintura é mais um elemento para a insegurança, porque as
pessoas não sentarão ali para conversar, tomar mate, viver a vida.
Mas a insegurança se dá com um discurso e atitudes que clamam
por segurança. Nossos planos diretores de 59 e 79 segmentaram Porto Alegre. Com
o discurso da modernidade a la Niemeyer e Lúcio Costa, que seguiam Le
Corbosier, dividiram a cidade em espaços residenciais, comerciais e
industriais. O certo seriam cidades miscigenadas, com comércio e pequenas
praças, para que estes locais possam ser acessados a pé ou de bicicleta. Cidade
onde poucos caminham ou pedalam são inseguras.
Assim como na Idade Média, quando se construía as muralhas ao
redor das fortalezas para se proteger do inimigo, na atualidade construímos
gigantescos paredões que nos isolam da rua - que acaba sendo propriedade de
ninguém e, desta forma, marginais e violentas. Por outro lado, quando
permitimos a abertura das janelas das nossas casas à cidade estamos
compartilhando o espaço com toda a sociedade, deixando o isolamento e
enfrentando em parceria os bons e maus momentos.
Por isso, estou certo que arquitetura e urbanismo adequados
podem minimizar o problema da insegurança pública ao intensificar a vivência
urbana, diminuir a segregação espacial e melhorar a qualidade de vida dos
cidadãos.
*Escritor e Consultor