O PT
reestatiza estradas
Editorial de O Estado de São Paulo
O governador do Rio Grande do Sul, Tarso Genro (PT), reestatizou oficialmente todos os polos de pedágio rodoviários que haviam sido concedidos à iniciativa privada em 1998. As estradas federais, que somam 983 km, voltarão à União e não terão cobrança de pedágio. Os 816 km restantes ficarão a cargo de uma estatal, a Empresa Gaúcha de Rodovias (EGR).
A medida de Tarso já seria, em si mesma, um contrassenso, pois se sabe
há muito tempo que o Estado é incapaz de administrar estradas. Mas seu
rompante, uma promessa de campanha, é ainda mais exótico quando se observa que
o governo federal, presidido por sua correligionária Dilma Rousseff, vai no
sentido totalmente oposto, empenhando-se em atrair investimento privado, ainda
que aos trancos e barrancos, para melhorar a intransitável malha rodoviária
federal.
O governador justificou sua decisão recorrendo ao surrado recurso de
caracterizar os empresários como sanguessugas: "Aqui temos um exemplo dos
problemas daquele sistema de pedágio. Milhões de reais circulavam nesta praça
de pedágio e não havia sequer o compromisso de fazer acostamento".
As concessionárias, com razão, qualificaram esse tipo de raciocínio de
"político e ideológico" - acusam o governo de descumprir contratos,
ao interferir nos preços dos pedágios, e pretendem cobrar na Justiça um passivo
que dizem chegar a R$ 3 bilhões. Para o presidente da Associação Gaúcha de
Concessionárias de Rodovias, Egon Schunck Júnior, "no Rio Grande do Sul,
ao contrário do resto do mundo, a opção é a estatização".
O motivo para a tendência mundial à privatização é simples: estradas
administradas pela iniciativa privada são melhores. Números da última pesquisa
anual da Confederação Nacional dos Transportes (CNT) sobre a qualidade das
rodovias provam isso. De acordo com o levantamento, 84,4% das estradas
concedidas a empresas privadas estão em ótimo ou bom estado, enquanto apenas
26,7% das rodovias sob responsabilidade estatal se encontram nessas condições.
O governo petista do Rio Grande do Sul, porém, acredita que terá
condições de administrar melhor as rodovias do Estado e de realizar os
investimentos necessários. Para isso, criou uma estatal, a EGR, que cobrará
pedágio mais barato e ainda fará melhorias.
Os números disponíveis, porém, mostram que esse objetivo não será
facilmente atingido. Enquanto as concessionárias investiram nas estradas 55% do
que arrecadaram, a EGR conseguiu alocar apenas 34,8%, segundo o jornal Zero
Hora. A meta, diz o governo gaúcho, é chegar a 80%, mas a experiência no plano
federal indica que, nesse caso, é grande a distância entre desejo e realidade.
O levantamento da CNT mostra que o investimento público federal em
rodovias no ano passado, até 8 de outubro, foi de R$ 4,2 bilhões - apenas 33,2%
do total autorizado. Na remota hipótese de que todo o investimento permitido
tivesse sido executado, ainda assim teria sido insuficiente. Para os
especialistas da CNT, seria preciso um aporte da ordem de R$ 355,2 bilhões para
todas as obras necessárias na malha rodoviária, como a duplicação de 30 mil km
e a construção de outros 18 mil km. O custo da melhoria das estradas e de sua
administração é, portanto, insuportável para qualquer Estado - ainda mais para
um Estado gigantesco e perdulário.
No caso das rodovias estaduais gaúchas, já se sabe que o fim da cobrança
de pedágio resultará na suspensão de serviços de ambulância e guincho. Já as
rodovias federais dependerão de recursos do Departamento Nacional de
Infraestrutura de Transporte, cuja situação é de penúria.
No palanque, porém, tudo fica muito mais fácil. Com fanfarra e discursos
inflamados, Tarso foi a uma das praças de pedágio, em Carazinho, para
simbolicamente retomá-la, recorrendo à demagogia das cancelas levantadas.
"Pode passar que é de graça!", gritou o governador para um motorista
de caminhão que buzinou ao atravessar o posto. No entanto, passada a festa
populista, os gaúchos sabem que esse "de graça" vai acabar saindo
muito caro.