Inimigos da democracia
Eleição de 2018 ameaçada por crime organizado,
criptomoedas e Fake News
Eliane Cantanhêde
Enquanto na superfície se discutem presidenciáveis,
partidos e alianças, nas profundezas a busca é por algo cada vez mais
complicado: o financiamento das campanhas de 2018, depois que o Supremo
Tribunal Federal (STF) derrubou as doações privadas e a opinião pública
rejeitou fundos realistas para as eleições. Sem uma coisa nem outra, o que
sobra?
Campanhas são sofisticadas e caras. E quem tem dinheiro
para campanhas neste País? O crime organizado, as igrejas com seus dízimos e os
partidos que ainda conseguem esconder fortunas em algum lugar do planeta. A
Polícia Federal já trabalha com a hipótese de dinheiro vivo em iates,
contêineres, caminhões e depósitos, além de apartamentos como aquele com R$ 51
milhões do ex-ministro e agora presidiário Geddel Vieira Lima.
O chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI),
general Sérgio Etchegoyen, não esconde o temor da influência do crime
organizado na eleição, que projeta influência também nos próximos governos e
legislativos. Lembra, inclusive, de episódios de eleições recentes, como a
morte de uma dezena de candidatos e cabos eleitorais na Baixada Fluminense,
criminosos incendiando locais de votação no Maranhão e avisos de “aqui mando
eu” em escolas que recebiam urnas eletrônicas.
O GSI integra uma força-tarefa com TSE, Defesa, Justiça e
PF, para tentar dar, sem garantia de sucesso, alguma ordem a esse caos, que
inclui não só a infiltração de quadrilhas (comuns...) como também novas formas
de comprometer o resultado. Uma delas são as criptomoedas, como o bitcoin, que
crescem exponencialmente e sem controle. São legais, mas dependem da ética de
cada um, algo para lá de abstrato. Qual é o Banco Central para esse tipo de
dinheiro? Quem fiscaliza? Quem pode rastreá-las? “A criminalidade migrou para
as criptomoedas”, diz Etchegoyen, reconhecendo a força do inimigo, que
representou um grande fluxo de dinheiro, por exemplo, nas eleições municipais
de 2016. Com um detalhe: a dificuldade de monitoramento, que pode caracterizar
quebra de sigilo, invasão de computadores... Ou seja, um prato feito para
criminosos e para verbas de campanha.
Outro alvo da força tarefa são as chamadas “fake news”,
que usam a tecnologia, particularmente a internet, para espalhar mentiras que
se propagam com uma velocidade estonteante. Em minutos, atingem milhões de
pessoas em diferentes partes do mundo e transformam-se em verdade. Sempre
perigoso, nas eleições é capaz de inverter resultados. As “fake news” tanto
podem ser a favor do candidato-cliente quanto contra os seus adversários.
Depois que o estrago é feito, especialmente na reta final
da eleição, não há como revertê-lo. O estrago propaga-se rapidamente, mas a
correção é lenta como a justiça brasileira e, até ser feita, Inês é Morta e o
candidato, derrotado. Junto com sua biografia, sua imagem e seu conceito
público.
Assim como no caso das criptomoedas, rastrear as “Fake
News” é como procurar agulha no palheiro. Na greve de policiais no Espírito
Santo, em fevereiro, as mensagens “viralizaram” do nada. Soube-se depois que se
originavam em Portugal e eram multiplicadas por “robôs”.
O Centro de Tecnologia da Agência Brasileira de
Inteligência (Abin) já avançou muito na detecção dessa prática, assim como o
Comando de Defesa Cibernética do Exército vem treinando, com sucesso, desde a
Copa e a Olimpíada. Mas combater esse inimigo quase invisível não é fácil.
Os candidatos a presidente, portanto, são apenas uma
parte das eleições, num momento de financiamento curto, denúncias
intermináveis, desenvoltura do crime organizado e novas formas, não de fazer
política, mas de cometer crimes a partir da política. E seja o que Deus e a
tecnologia quiserem!
*Publicado no Portal Estadão em 26/11/2017