Pior do que parecia*
Com 16,4 milhões de desempregados ou subocupados no
segundo trimestre, o quadro do mercado de trabalho é bem pior que aquele
mostrado, até agora, pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua
(Pnad Contínua). Mais completo, o novo cenário apresentado pelo Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) permite uma noção mais precisa dos
danos causados pela recessão aos trabalhadores e às suas famílias. Divulgado
pela primeira vez na quinta-feira passada, esse levantamento mais amplo
enumera, além das pessoas incapazes de encontrar emprego, aquelas com menos de
40 horas semanais de trabalho e também as integrantes de um grupo classificado
como força de trabalho potencial.
Com a retração econômica, o desemprego aumentou
rapidamente nos últimos dois anos, no Brasil. Doze milhões de pessoas
procuraram trabalho, sem sucesso, no período de três meses terminado em agosto.
Esse grupo correspondeu a 11,8% da força de trabalho, taxa superior às da maior
parte dos países da Europa. Muitos destes ainda se recuperam da crise iniciada
em 2008. No segundo trimestre, a taxa brasileira, de 11,3%, já havia superado a
média da União Europeia. Os novos indicadores agora divulgados pelo IBGE se
referem a esse período.
Aos 11,6 milhões de desempregados no período de abril a
junho somam-se agora, com a nova informação, 4,8 milhões de subocupados por
insuficiência de horas de trabalho. Chega-se com isso a uma taxa combinada de
16%, correspondente a 16,4 milhões de pessoas em dificuldades. A situação dos
desempregados – aqueles desprovidos de ocupação – é certamente mais grave que a
dos subocupados, mas é outro o ponto importante para a avaliação do cenário de
hoje e das perspectivas de curto e de médio prazos.
O emprego, sabe-se há muito tempo, é o último indicador a
se normalizar, quando um país sai de uma recessão. No começo da recuperação, as
empresas conseguem produzir mais ocupando a capacidade ociosa, isto é, as
máquinas, equipamentos e instalações mantidos com baixa utilização durante a
crise. Além disso, a reativação normalmente ocorre com aproveitamento mais
intenso da mão de obra já empregada. Tipicamente ocorre, nessa fase, um aumento
de produtividade da força de trabalho disponível nas empresas.
A lógica empresarial pode justificar o adiamento das
contratações. Não há por que recrutar trabalhadores adicionais enquanto se pode
obter, dentro dos limites legais, maior produção por unidade de mão de obra.
Essa lógica, no entanto, vale apenas para a gestão de custos de cada empresa.
Para a economia, a permanência de grande número de pessoas no desemprego pode
representar um freio. Mesmo com a melhora das perspectivas gerais, o
desempregado e sua família tendem a continuar contendo os gastos.
Isso significa evitar o consumo de bens ou serviços
considerados supérfluos ou inessenciais. Significa também adiar o endividamento
e as grandes despesas, como compras de carros e de equipamentos domésticos. Uma
empresa pode, portanto, administrar seus custos com prudência, adiando contrações,
e ao mesmo tempo ser forçada a enfrentar uma lenta recuperação do mercado. Isso
ocorrerá simplesmente porque muitos empregadores terão decidido ao mesmo tempo
limitar o recrutamento de pessoal até a atividade ganhar maior impulso.
Com a medida mais simples do desemprego já seria
possível, hoje, apostar numa lenta recuperação do mercado interno. Afinal, 12
milhões de desocupados são um número enorme, até num país com mais de 200
milhões de habitantes.
Além disso, falta saber se mais pessoas serão adicionadas
a esse contingente. Não há segurança quanto a isso, neste momento. Com a adição
dos subocupados o cenário fica pior. Também esses, embora em melhor situação
que a dos outros, vivem dificuldades e dificilmente serão estimulados a gastar
muito mais a curto e a médio prazos. Os destroços mais feios deixados pelo
petismo continuarão marcando o cenário ainda por um bom tempo.
Publicado no Portal Estadão em 15/10/2016