O governador Caixa Dois
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Fernando Pimentel/Foto Veja |
No projeto de poder traçado pela cúpula do PT, vencer as
eleições para o governo de Minas Gerais em 2014 era mais que uma questão de
honra. Era vital. As pesquisas indicavam que havia chances reais de o petista
Fernando Pimentel interromper a hegemonia do PSDB no estado. No plano nacional,
Dilma Rousseff também estava de olho nas urnas mineiras. Um bom desempenho em
Minas poderia garantir a disputa a seu favor. Um mau desempenho poderia influir
na disputa presidencial e consolidar de vez a imagem de candidato imbatível do
seu principal adversário, o ex-governador mineiro Aécio Neves. Não havia uma
segunda opção. O PT montou uma estrutura de campanha como poucas vezes se viu.
Carros, aviões, farto material de propaganda, marqueteiros contratados a peso
de ouro, centenas de comitês municipais. Não faltou dinheiro. De azarão,
Fernando Pimentel logo passou a franco favorito e ganhou no primeiro turno. No
plano nacional, o segundo maior colégio eleitoral do país assegurou a Dilma a
vitória no segundo turno por uma diferença apertada de pouco mais de 3 milhões
de votos. Só Minas Gerais garantiu 6 milhões de votos à presidente. A investida
se mostrou perfeita. Quase perfeita.
Dois dias
depois do primeiro turno, com o petista Pimentel ainda comemorando a vitória
esmagadora, a Polícia Federal interceptou no aeroporto de Brasília um avião
turboélice procedente de Belo Horizonte. Uma denúncia anônima alertou os
agentes sobre a presença de dinheiro clandestino a bordo. Não era trote. Os
agentes encontraram 113 000 reais dentro de uma sacola. Mais interessante,
porém, era a identidade de um dos passageiros. Assustado, falando intensamente
ao telefone desde que a aeronave havia sido cercada pelos policiais, estava o empresário
Benedito de Oliveira Filho. Amigo íntimo de Fernando Pimentel, Bené, como é
conhecido, é um daqueles personagens que ninguém sabe ao certo de onde
surgiram, o que fazem, para quem trabalham. É um daqueles personagens que, de
uma hora para outra, aparecem do nada, são tratados como autoridade, se
comportam como autoridade e vivem as delícias de uma autoridade. Doutor Bené
tinha todos esses predicados.
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Benê Neto |
Em 2010,
quando Dilma foi eleita presidente pela primeira vez, Doutor Bené saiu das
sombras pela primeira vez. Ninguém sabia, mas, no governo petista, ele se
transformara num megaempresário. Em poucos anos ganhou contratos que somariam
mais de 500 milhões de reais - muitos deles sem licitação e, pior, sem a devida
prestação de serviço. Mesmo com esse currículo desabonador, Bené foi escolhido
como uma espécie de gerente do comitê central da campanha presidencial do PT.
Ao mesmo tempo em que faturava milhões do governo, ele era o responsável por
pagar as despesas do comitê - as corriqueiras e também as nada republicanas.
Uma delas, a que trouxe o operador à luz, resultou num grande escândalo. O
empresário arregimentou um grupo de arapongas para produzir dossiês contra
adversários da candidata petista. Na época, o coordenador da campanha e chefe
de Bené era Fernando Pimentel. Quatro anos depois, a história se repetiu.
A bordo da
aeronave, além do dinheiro, a Polícia Federal encontrou documentos e arquivos
digitais que, pouco depois, se mostrariam cruciais para uma descoberta muito
maior. Sempre nas sombras, Bené tinha participado ativamente da vitoriosa
campanha do amigo Fernando Pimentel ao governo de Minas. Os papéis e anotações
mostravam que o protagonismo do empresário no escândalo da campanha de 2010 não
serviu, sequer, como lição - nem para ele, nem para seu patrão. Bené continuou
a ganhar milhões no governo federal e, paralelamente, a prestar auxílio
financeiro aos seus companheiros petistas, em especial a Fernando Pimentel.
Planilhas apreendidas indicavam que o dinheiro do empresário bancou parte da campanha
de Pimentel, além de suas contas pessoais, passeios e mordomias, inclusive no
período em que ele esteve no cargo de ministro do Desenvolvimento do governo
Dilma. A mão generosa era extensiva a Carolina Oliveira, a mulher do
governador. Era generosidade com dinheiro público.
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Carolina Oliveira Pimentel |
Deflagrada
pela Polícia Federal a partir dos indícios surgidos no flagrante do aeroporto,
a Operação Acrônimo mergulhou num poço de ilegalidades patrocinadas pela dupla
Bené- Pimentel que extrapola em muito os limites do favorecimento pessoal. Os
investigadores já descobriram que o empresário atuou como um eficiente pagador
de despesas não contabilizadas da campanha de Pimentel ao governo. Em um
relatório juntado aos autos na terceira etapa da operação, iniciada na semana
retrasada, a delegada encarregada do caso afirma, taxativamente, que o
governador cometeu crime eleitoral ao esconder de sua prestação de contas
despesas milionárias contabilizadas apenas no caixa dois administrado por Bené.
Os policiais juntaram aos autos cópias de notas fiscais que mostram que
gráficas da família de Bené produziram uma parte significativa do material de
campanha usado pelo PT, sem que esse custo fosse declarado à Justiça Eleitoral,
como manda a lei. Um crime que pode resultar na cassação de mandato do
governador. Mas é ainda mais grave.
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Mauro Borges |
As
investigações estão comprovando que o dinheiro que abastecia esse caixa dois
era proveniente de negócios escusos fechados no governo federal nos tempos em
que Pimentel era ministro e tinha em mãos uma caneta poderosa, sob a qual
estavam vinculadas, por exemplo, decisões importantes do Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), subordinado à pasta que ele
comandava. A partir dos documentos apreendidos, de e-mails e mensagens
telefônicas interceptadas, a polícia já reuniu provas de que os amigos de
Pimentel cobravam propina de empresas em troca de decisões do ministério e do
BNDES. Para a PF, a quadrilha começou a vender facilidades em 2011, com
Pimentel, e seguiu com o sucessor dele, Mauro Borges. Quem intermediava as
decisões de interesse das empresas era Bené. E, depois que Pimentel deixou o
governo federal, quem atuava para que essas decisões fossem tomadas era Mauro
Borges, também amigo do petista. Os lucros eram repartidos entre todos - incluindo
a campanha, o governador e sua mulher. (Veja.com/Conteúdo)