sexta-feira, 10 de abril de 2015

Opinião

Temer e o vácuo de poder

Eliane Cantanhêde*
10 Abril 2015

A economia e a política são o coração e o pulmão do governo, aqui e em qualquer lugar do mundo. A presidente Dilma Rousseff, antes tão centralizadora, delegou a economia para um estranho no ninho, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, e a política para o seu vice, Michel Temer, que preside justamente o PMDB.

Então, o que faz a presidente da República? Inaugura unidades do Minha Casa Minha Vida, faz discursos dizendo que a Petrobrás está uma maravilha, dá entrevistas para TVs estrangeiras, tira fotos em reuniões protocolares com prefeitos e, se preside alguma coisa, preside solenidades no Planalto.

São atividades acessórias, senão decorativas, de uma presidente que nunca tinha sido eleita coisa nenhuma antes de ser empurrada rampa acima do Planalto, fracassou na condução da economia no primeiro mandato e não tem vocação para o fundamental a um(a) líder: a política.

Já seria grave se faltassem três meses para o fim do mandato, mas é muito pior porque tudo isso ocorre em três meses do início do mandato. É um governo novo que se move como velho, cheira a mofo, não gera expectativas.

Levy, um estranho nesse ninho, é o onipotente e o onipresente da economia. Define a política, redige os projetos, negocia com o Congresso, formaliza os ajustes acertados. Em linguagem a la Lula, Levy chuta em gol e defende ao mesmo tempo. Se der certo, a vitória será de Dilma?

Temer é do ramo, conhece a política, chama os políticos pelo nome, sabe se movimentar pelos salões e gabinetes do Congresso, mas delegar a articulação política para ele num momento como esse é mais do que temerário, por motivos óbvios. Como é temerário que ele passe a ser o interlocutor direto do governo com Lula e com Fernando Henrique Cardoso, sem intermediários - ou intermediária.

Temer é presidente de fato, e ainda de direito, do PMDB, a maior fonte de problemas e a maior ameaça a Dilma. Vamos pensar juntos: quando o pau quebrar entre o partido e o Planalto - e quebra todo santo dia -, como Temer se comportará? Será leal à presidente e ao governo, ou ao partido que representa desde sempre e que preside até agora? É um risco que Dilma jamais poderia correr.

Para dramatizar mais a fragilidade e o isolamento de Dilma, há também a fragilidade e o isolamento do próprio PT. Se Levy tem alma e bico tucano, alçar Temer à articulação política é dar todo o poder - aquele que emana do povo, pelo povo e para o povo - ao PMDB. O partido que mais fustiga o Planalto tem agora a articulação política do governo, as presidências da Câmara e do Senado. Fechou o cerco.

É o PMDB, por exemplo, quem aperta ou afrouxa as rédeas das CPIs e quem expôs o tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, a uma saraivada de perguntas constrangedoras e transmitidas por horas e horas ao vivo, para quem quisesse ver e ouvir. E é quem vai acabar tendo o comando das CPIs articuladas no Senado. Assunto não falta: BNDES, HSBC, Carf, fundos de pensão. Uma dessas CPIs acaba ganhando vida para atazanar ainda mais o PT e o governo.

Tanto quanto é legítimo perguntar o que faz a presidente da República, é também razoável perguntar: e o PT, que ganhou as eleições em outubro, manda onde, em quem, em quê?

Em vez de tentar uma resposta, vamos a um personagem que resume tudo: o petista Pepe Vargas, ex-articulador político. Criticado sem piedade por Lula e demitido por Dilma pela imprensa, ele convocou entrevista para anunciar que tinha sido convidado para ser ministro de Direitos Humanos. Recebeu um telefonema, parou a entrevista no meio e voltou dizendo que... não tinha sido convidado para nada.

Que sensação fica? Como Dilma não manda mais nada, precisa demonstrar força em cima dos mais fracos. Pepe Vargas não é só um ministro fraco, é também do PT, um partido cada vez mais fraco.

Ratos. Sobre os ratos na CPI da Petrobrás, sem comentários.

*Jornalista - Coluna publicada no Estadão

Operação Lava Jato - A Origem - 2

Corrupção envolve Ministério da Saúde e Caixa

A Operação Lava Jato da Polícia Federal detectou um esquema de repasse de dinheiro realizado por uma agência de publicidade contratada pelo Ministério da Saúde e pela Caixa Econômica Federal para duas empresas de fachada ligadas ao ex-deputado petista André Vargas, preso nesta sexta-feira durante a 11ª fase da operação, batizada 'A Origem'.

Segundo a PF, a agência Borghilowe, com filiais em São Paulo, Brasília e Rio de Janeiro, repassava 10% dos ganhos a título de bônus de volume a empresas de Vargas e seu irmão, Leon, também preso nesta sexta em sua casa no Paraná. O publicitário Ricardo Hoffmann, diretor geral da agência Borghilowe, também foi preso temporariamente.

Os valores totais dos repasses como bônus ainda estão em apuração. Desde 2011, a Borghilowe recebeu do governo federal 112,8 milhões de reais em pagamentos referentes a campanhas desenvolvidas para o Ministério da Saúde, de acordo com dados do Portal da Transparência. O contrato foi assinado em 2010. "A princípio esse bônus ia para os políticos", disse o delegado Márcio Anselmo, que conduziu a investigação. "Ainda não dá para estimar os valores porque dependemos das buscas de hoje."

A PF identificou a operação como um crime de lavagem de dinheiro. Produtoras subcontratadas pela Borghilowe para gravar filmes publicitários e spots de rádio do Ministério da Saúde e da Caixa faziam pagamentos de comissões por volume, orientadas pela Borghilowe, às empresas fantasma de Vargas. Na prática, em vez de pagar o bônus à agência principal, prática comum no mercado da publicidade, as produtoras subcontratadas pela Borghilowe - e que de fato 

prestavam serviços - pagaram para as duas empresas de Vargas e seu irmão. As produtoras serviram para intermediar pagamentos ao deputado. Por meio de suas empresas, o ex-deputado emitia notas frias, ou seja, de serviços que não foram prestados. As empresas dos irmãos Vargas não tinham sede nem funcionários, segundo a PF.

"Essas empresas não existem fisicamente e recebem um percentual equivalente a 10% do contrato firmado com a empresa principal. Então, tudo nos leva a crer que seja um percentual a ser desviado para o agente público", disse o delegado Igor Romário de Paula, da Delegacia Regional de Combate ao Crime Organizado.

A Caixa informou nesta sexta que abrirá uma investigação interna para apurar os fatos revelados pela Lava Jato. O banco ainda afirmou em nota que colaborará integralmente com as investigações, encaminhando imediatamente todos os contratos relacionados às empresas citadas à Controladoria-Geral da União, Polícia Federal e Ministério Público".

Os investigadores encontraram um repasse de 2,4 milhões de reais do doleiro Alberto Youssef para o irmão de Vargas, por meio de uma consultoria da contadora Meire Poza. Uma casa de alto padrão em Londrina (PR) foi registrada no nome da mulher de Vargas, que não tinha lastro financeiro para a aquisição, em 2011. O imóvel custou 980.000 reais. A Justiça Federal decretou o arresto da residência.

Vargas já era investigado por tráfico de influência em associação ao doleiro para beneficiar o laboratório Labogen Química Fina em parceria com o laboratório da Marinha, para firmar um convênio de 135 milhões de reais no Ministério da Saúde. Servidores do ministério serão ouvidos pela PF tanto por causa dos contratos de publicidade quanto pelo convênio do Labogen. (Com VEJA/Conteúdo)

Opinião

As concessões da presidente

O ESTADO DE S.PAULO
10 Abril 2015


Quando as pesquisas revelam que dois em cada três brasileiros consideram o governo ruim/péssimo e três em cada quatro afirmam não confiar na presidente da República, o segundo mandato de Dilma Rousseff se torna deslegitimado de fato logo no seu início. Em consequência, o País mergulha num processo que se pode chamar de "bordaberryzação", por analogia na forma - e tão somente na forma - com o que ocorreu no Uruguai na década de 1970. Lá, o presidente conservador Juan María Bordaberry, principalmente por ter-se revelado incapaz de combater a ação guerrilheira dos tupamaros, para permanecer no cargo teve de ceder o comando de fato do país aos militares. Aqui, a presidente petista Dilma Rousseff, incapaz de controlar a crise criada pelo acúmulo de seus erros na condução da economia e da política, se vê constrangida a entregar o comando da economia a quem professa convicções opostas às que sempre defendeu e a condução da política a forças que, embora formalmente aliadas, ela sempre tratou com certo desprezo e, mais recentemente, como inimigas.

Joaquim Levy à frente do Ministério da Fazenda e o vice-presidente Michel Temer no comando plenipotenciário da articulação política, se não significam exatamente a "renúncia branca" de Dilma à Presidência, como definiu o senador Aécio Neves, traduzem, de qualquer forma, a rendição da chefe do governo à evidência de que não é mais capaz - se é que algum dia o foi - de comandar o País com suas próprias forças e ideias. E essa rendição - concretizada sem que do episódio se possa extrair mérito ou grandeza - poderá vir a ser considerada, de uma perspectiva histórica, o marco da falência do projeto de poder que o PT criou para durar para sempre.

Notícias e comentários veiculados em todas as mídias, ainda sob o impacto dos acontecimentos dos últimos dois dias, dão conta de que Lula teria ficado aliviado e satisfeito com o desfecho da crise da coordenação política - uma crise dentro da crise. É realmente admirável a capacidade que o ex-presidente tem de fazer repercutir nos veículos de comunicação - a "mídia golpista" que o PT não se cansa de denunciar - suas tentativas de transformar limão em limonada. Mas aliviado deve ter ficado. Afinal, o novo protagonismo de Michel Temer arrefece o tiroteio que dominava a cena política e permite ao ex-presidente planejar melhor seus próximos passos para tentar evitar a crescente ameaça do naufrágio de suas pretensões de voltar à Presidência. Satisfeito, porém, é improvável que Lula tenha ficado.

Em primeiro lugar, porque o fracasso da criatura é o fracasso do criador. E até os eleitores do PT já processam a ideia - e as pesquisas o revelam - de que Lula tem tudo a ver com a lambança em pauta. Além disso, foi o próprio ex-presidente quem colocou na cabeça de Dilma a ideia que se revelou impraticável de nomear Eliseu Padilha para a articulação política. Era perfeitamente previsível que Renan Calheiros e Eduardo Cunha se oporiam a essa nomeação, como o fizeram, porque a presença de um correligionário de reconhecida competência política no lugar do trapalhão Pepe Vargas certamente comprometeria a posição de força que ambos exibem em sua relação política e institucional com o Palácio do Planalto.

É claro que, do ponto de vista de Calheiros e de Cunha, Michel Temer é uma ameaça até maior do que Padilha. Mas nenhum dos dois pode se opor abertamente ao vice-presidente da República e presidente de seu partido, o PMDB. Por isso mesmo ambos fizeram declarações anódinas de apoio à decisão de Dilma. Lula está em posição semelhante. Se, na articulação política, preferisse Temer a qualquer outro peemedebista, teria dito antes a sua pupila. Mas ele é esperto o suficiente para não encher a bola de quem sabe que tem cacife para lhe criar problemas mais para a frente. Tais espertezas contribuem para tornar imprevisível o futuro do governo petista.

Apenas a título de curiosidade - e feita a imprescindível ressalva de que aqui os militares permanecem nos quartéis -, não custa lembrar que no Uruguai o presidente Bordaberry acabou sendo defenestrado por quem o mantinha no poder.

Operação Lava Jato- A Origem

PF prende três ex-deputados


André Vargas


A Polícia Federal (PF) deflagrou a 11ª fase da Operação Lava-Jato, em seis estados brasileiros e no Distrito Federal. A ação, intitulada “A Origem”, cumpre sete mandados de prisão, 16 de busca e apreensão e nove de condução coercitiva. Entre os presos estão os ex-deputados André Vargas, Luiz Argôlo (SD-BA) e Pedro Corrêa, que já cumpre prisão em regime semiaberto pelo mensalão do PT.


Luiz Argôlo

Também foram detidos o irmão de André Vargas, Leon Vargas; Ivan Vernon da Silva Torres, apontado como laranja de Vargas; Élia Santos da Hora, secretária de Argolo; e Ricardo Hoffmann, que é diretor de uma agência de publicidade. Segundo a PF, nessa fase, as bases de investigação são os diversos inquéritos policiais e a baixa de procedimentos que tramitavam no Supremo Tribunal Federal (STF), apurando fatos criminosos atribuídos a três grupos de ex-agentes políticos, que abrangem os crimes de organização criminosa, quadrilha ou bando, corrupção ativa, corrupção passiva, fraude em procedimento licitatório, lavagem de dinheiro, uso de documento falso e tráfico de influência.

Além de fatos ocorridos no âmbito da Petrobras, a polícia apura desvios de recursos em outros órgãos públicos federais. Todos os presos serão levados para a Superintendência da Polícia Federal em Curitiba, onde permanecerão à disposição da Justiça Federal. São cerca de 80 policiais federais em ação nos estados do Paraná, Bahia, Ceará, Distrito Federal, Pernambuco, Rio de Janeiro e São Paulo.

Avião emprestado

Conforme as investigações, André Vargas usou um avião do doleiro Alberto Youssef para uma viagem a João Pessoa. O empréstimo da aeronave foi discutido entre os dois por mensagens de texto no início de janeiro. Em outras mensagens, Vargas e o doleiro discutiram assuntos relacionados a contratos com o Ministério da Saúde, por meio do Laboratório Labogen, empresa acusada de ter ligações com Youssef.