O primeiro domingo do outono, nos trouxe temperaturas agradáveis e um sol dos mais lindos. Não há, pelo menos até aqui, o que reclamar do dia. Pode ser que mude, mas então é melhor aproveitar bem esta manhã outonal de domingo.
Um dos editoriais do jornal Estado de São Paulo - Peça de propaganda - mostra exatamente o que significa mais um "pacote contra a corrupção" que o governo tenta empurrar como resposta aos manifestantes do último dia 15. Leia e comprove.
Tenham todos um Bom Dia!
Peça de
propaganda
O ESTADO DE
S.PAULO
22 Março 2015
O alardeado pacote anticorrupção do
governo federal é mais uma mostra de que a presidente Dilma Rousseff não
entendeu a voz das ruas. A população não está pedindo mais leis - a população
quer que as leis sejam cumpridas. Mas Dilma faz questão de não ouvir. Como já
está ficando habitual, ela simplesmente repete o mesmo discurso. "Somos um
governo que não transige com a corrupção e temos o compromisso e a obrigação de
enfrentar a impunidade que alimenta a corrupção", disse na cerimônia de lançamento
do pacote anticorrupção.
O pacote anunciado pelo Palácio do
Planalto inclui propostas de alteração na atual legislação - dois projetos de
lei, uma proposta de emenda à Constituição e dois pedidos de urgência na
votação de projetos já existentes no Congresso - e o decreto que regulamenta a
Lei Anticorrupção, bem como a criação de um grupo de trabalho coordenado pelo
Ministério da Justiça para estudar formas de acelerar os processos relacionados
com a prática de ilícitos contra o patrimônio público.
À primeira vista, a quantidade de medidas
pode impressionar. Mas elas não trazem propriamente nenhuma novidade. É
simplesmente um jogo de cena, na tentativa de vender uma imagem de rigor contra
a corrupção. A imagem, portanto, não se sustenta.
Por exemplo, o Palácio do Planalto
pede ao Congresso urgência na votação de dois projetos de lei. Ora, há um bom
tempo o governo tem maioria nas duas Casas legislativas, e não se viu nenhum
esforço do Palácio do Planalto para dar celeridade a esses projetos. Tarde o
governo se apressa.
Pressa, no entanto, que não se viu na
regulamentação da Lei Anticorrupção. A lei foi aprovada após as manifestações
de junho de 2013 e entrou em vigor seis meses depois. Mas a presidente Dilma
Rousseff levou mais de 13 meses para regulamentá-la. O Palácio do Planalto dizia
que estava estudando detidamente o assunto que, a seu ver, era complexo e
exigia uma longa ponderação. E o que se encontrou no decreto agora publicado?
Uma longa e enfadonha repetição do conteúdo da própria Lei Anticorrupção, que a
rigor exigia regulamentação apenas do inciso VIII do art. 7.º.
Os projetos de lei anunciados no
pacote também estão longe de significar um novo paradigma no combate à
corrupção. Como a própria presidente disse, ao comentar o projeto de lei que
criminaliza o caixa 2, estamos "transformando esse crime em crime",
ou seja, mudando bem pouca coisa.
Ainda que o conteúdo marqueteiro seja
explícito em todo o pacote anticorrupção, há um projeto de lei que escancara a
finalidade enviesada do Palácio do Planalto. É a proposta para que se exija
ficha limpa dos ocupantes de cargos em comissão e de confiança na administração
pública direta e indireta, incluindo os diretores de estatais. Em primeiro
lugar, chama a atenção a incongruência da proposta com a prática lulopetista
nos seus anos de poder no governo federal. Pois o poder público dispõe de meios
para avaliar a competência e a honradez de quem vai ocupar cargo na
administração. Depois, se a inquilina do Palácio do Planalto não quer ver
corruptos ocupando cargos em comissão ou sendo diretores de estatal, basta que
ela não os nomeie. No entanto, a presidente Dilma prefere propor uma lei - o
resto continua como está.
O pacote anticorrupção contém um
grande sofisma. Sendo um conjunto de propostas de mudança da legislação - que
na prática pouco mudam -, a presidente Dilma tenta colocar a responsabilidade
pelo combate à corrupção nas costas do Congresso, dando a entender que ela já
fez a sua parte. É um tremendo equívoco achar que a impunidade reinante no País
se deva à falta de leis adequadas. Obviamente, sempre é possível aperfeiçoar a
legislação penal, e cabe ao Poder Legislativo fazê-lo. Mas também é verdade que
o Poder Executivo pode e deve fazer muito no combate à corrupção. A começar por
não estimular a corrupção nem institucionalizá-la, por exemplo, nas estatais -
o que, segundo o Ministério Público Federal, o partido da presidente e pessoas
por ele indicadas fizeram com grande competência na Petrobrás.