O Apocalipse do petismo
Reinaldo Azevedo*
Diga-se
pela enésima vez: o PT não inventou a corrupção. É claro que não! O que o
partido fez foi transformá-la num sistema e alçá-la à categoria de uma ética de
resistência. Nesse particular, sem dúvida, inovou. Se, antes, a roubalheira
generalizada era atributo de larápios, de ladrões, de safados propriamente, ela
se tornou, com a chegada dos companheiros ao poder, uma espécie de imperativo
do “sistema”. Recorrer às práticas mais asquerosas, contra as quais o partido
definiu o seu emblema na década de 80 — “Ética na política” —, passou a ser
chamado de “pragmatismo”.
Observem que o partido não se tornou “pragmático” apenas nessas
zonas em que a ação pública se transforma em questão de polícia. Também a sua
política de alianças passou a ter um único critério de exclusão: “Está do nosso
lado ou não?”. Se estiver, pouco importa a qualidade do aliado. Inimigos
juramentados de antes passaram à condição de fieis aliados. O símbolo dessa
postura, por óbvio, é José Sarney. No ano 2000, Lula demonizava Roseana nos
palanques; em 2003, os petistas celebraram com a família uma aliança de ferro.
Os demônios que vão saindo das profundezas da Petrobras são
estarrecedores. Não se trata, como todos podemos perceber, de desvios aqui e
ali, como se fossem exceções a regras ancoradas no rigor técnico. Não! A
corrupção era, tudo indica, sistêmica; não se tratava de um corpo estranho; era
ela o organismo. E, convenham, parece que não havia valhacouto mais acolhedor e
seguro do que a estatal. A Petrobras, com a devida vênia, nunca foi exatamente um
exemplo de transparência, já antes de Roberto Campos ter-lhe pespegado a pecha
de “Petrossauro”.
Em nome do nacionalismo mais tosco — antes, meio direitoso, com
cheiro de complexo burocrático-militar; depois, com o viés esquerdoso, tão bocó
como o outro, só que ainda mais falsificado —, há muitos anos a empresa se
impõe ao país, não o contrário. Não foram poucas as vezes em que mais a
Petrobras governou o Brasil do que o Brasil, a Petrobras. Com a chegada do PT
ao poder, o que já era nefasto ganhou ares de desastre.
A empresa passou a ser o “bode exultório” — que é o oposto do
“bode expiatório” — da esquerdofrenia petista. E porque o partido é
esquerdofrênico? Porque o estatismo advogado pelos “companheiros” só pode ser
exercido, como é óbvio, com o concurso do capital privado, com o auxílio de
alguns potentados da economia, com o amparo de quem reúne a expertise para
tocar a infraestrutura. E o resultado é o que se tem aí.
Não vou livrar a cara das empreiteiras, não. Quem não quer não
corrompe nem se corrompe. Mas não dá para esquecer o depoimento de Alberto
Youssef ao juiz Sérgio Moro, em que sobressaem duas informações importantes:
1) o
doleiro afirmou que era pegar ou largar; ou as empreiteiras aceitavam pagar o
preço — ou melhor, incluir a propina no preço —, ou estavam fora do jogo; e boa
parte preferiu jogar;
2) indagado
por Moro se as empreiteiras costumavam cumprir a sua parte no acordo, Youssef
disse que sim. E explicou os motivos: ela tinham muitos interesses em outras
áreas do governo, não apenas na Petrobras. Afinal, também constroem
hidrelétricas, estradas, infraestrutura de telecomunicações etc.
Assim, duas conclusões se fazem inevitáveis:
1) as
empreiteiras, tudo indica, atuaram como corruptoras, sim, mas é razoável supor
que falavam a linguagem que o outro lado queria ouvir;
2) não
há por que o padrão de governança das demais estatais e órgãos públicos
federais ser diferente. Como já afirmei neste blog muitas vezes, estamos diante
de um método, não de um surto ou de um lapso da razão.
Governo em parafuso
Já está mais do que evidente, a esta altura,
que Lula e Dilma foram suficientemente advertidos para parte ao menos dos
descalabros. Os que se lançaram a tal empreitada, talvez ingenuamente,
imaginavam que a dupla não sabia de nada. A questão, meus caros, desde
sempre, é outra: havia como não saber? Tendo a achar que não. O TCU
alerta, por exemplo, para os desvios da refinaria de Abreu e Lima desde 2008.
Recorram aos arquivos. A partir de 2010, o então presidente Lula
começou a atacar os órgãos de fiscalização e controle, muito especialmente o
TCU. No dia 12 de março daquele ano, foi ao Paraná inaugurar a primeira etapa
das obras de modernização e ampliação Refinaria Presidente Getúlio Vargas
(Repar), em Araucária, na região metropolitana de Curitiba. O Tribunal de
Contas havia recomendado a suspensão de verbas para a Repar justamente por
suspeita de fraude e superfaturamento. Lula não deu pelota e ainda atacou o
TCU. Leiam:
“Sou favorável a toda e qualquer
fiscalização que façam, até 24 horas, via satélite. Acontece que as coisas são
complicadas. Muitas vezes, as pessoas levantam suspeitas de uma obra, paralisam
a obra e, só depois da obra paralisada, chegam à conclusão de que está correta.
Quem paga o prejuízo da obra paralisada? Não aparece. O povo brasileiro paga
porque não tem obra”.
Pois é… Vejam quanto “o povo brasileiro” está pagando pelo método
Lula de fazer política.
O terremoto que está em curso abalou as empreiteiras, aquelas que
ou pagavam a propina ou ficavam fora do negócio.. Pesos pesados do setor estão
na cadeia, alguns em prisão preventiva, e outros, em prisão provisória. Mas
estamos bem longe do topo na escala. Estima-se que o esquema possa enredar nada
menos de 70 políticos, muitos deles com mandato. A delação premiada pode
devastar parte considerável da classe política brasileira. E, aí sim, talvez
saibamos o que é a terra a tremer.
E a gente se espanta ao constatar que o segundo mandato de Dilma
ainda não começou. Talvez só em janeiro muita gente se dê conta de que pode
haver mais quatro anos de mais do mesmo, só que num cenário à beira do abismo.
Policiais Federais chamaram esta sexta de “Dia do Juízo Final”,
que é apenas uma passagem do Apocalipse!
* do Blog do Reinaldo