O sofá amarelo
Cesar Cabral*
Era uma vez, numa aldeia bem longe daqui, um homem admirado
por todos graças a sua coragem e inteligência. Além disso, ele era casado com a
mulher mais linda da aldeia e tinha um belo sofá amarelo na sala. Certa vez,
enquanto ele trabalhava no campo lavrando a terra a mulher dele encontra, por
acaso, na feira da aldeia, um belo rapaz. Eles trocam olhares e sentem que um
furioso amor lhes toca o coração. O rapaz que estava de passagem resolve ficar
na aldeia para estar mais perto daquela mulher que o deixara com uma
devastadora sensação de um arrasador, digamos, ardor interior.
O rapaz era ferreiro, um bom ferreiro, e malhando o ferro ardente,
em brasa, fazia diversas coisas úteis que agradavam a todos, sobretudo as
mulheres com os objetos de cozinha que
fazia com tanto zelo. Certa vez a linda e sedutora mulher do
lavrador que se orgulhava de seu sofá amarelo, procurou o rapaz na ferraria
para fazer-lhe uma encomenda.
O momento do encontro foi quase delirante. O coração de ambos
ardia como a fornalha onde ele colocava seus ferros em brasa. Abraçaram-se,
beijaram-se e ela convidou o jovem para ir até a casa dela no dia seguinte, ao
meio dia, assim que ela voltasse do campo para onde ela levava diariamente o
almoço do marido que lá permanecia do amanhecer ao por do sol.
Assim os amantes se amavam todos os dias no sofá amarelo da sala
sem nenhuma preocupação de serem surpreendidos com o marido traído, mas sempre
alegre.
Um dia pouco depois do almoço o lavrador resolveu voltar
para casa; nunca se soube o motivo. Ao abrir a porta encontrou sua bela mulher
fazendo amor com o jovem ferreiro justo sobre seu sofá amarelo. Furioso,
amaldiçoou os dois. O rapaz fugiu pela janela. A mulher gritou: “não é bem isso
que você está vendo!”.
Amargurado, inseguro, sentindo-se ameaçado, sem câmeras de
vigilância, resolveu adotar a melhor medida de proteção; de assegurar que sua
honra não fosse nunca mais posta em risco.
Decidido, seguro de si, confiando que, com a atitude que
estava prestes a tomar, ninguém mais entraria naquela casa na ausência dele e
fizesse com sua bela mulher o que tantas e tantas vezes fizeram, ela e o jovem
ferreiro da aldeia.
Tomado pelo ódio, sentiu crescendo dentro dele uma enorme dilma
russefe com unhas pontiagudas postiças que rasgavam seu coração. Tomou seu sofá
amarelo sobre os ombros, levou-o até o campo em local bem distante e ateou fogo
no culpado de sua desgraça.
Depois, aliviado e purificado, voltou para casa e para sua
bela mulher.
Em outra aldeia, do outro lado do oceano, distante daquela
do inteligente homem do sofá amarelo, uma lei acaba de proibir o uso de bonés
em lugares públicos. A arguciosa medida é para facilitar a identificação de
assaltantes. Nesse caso os bonés não são necessariamente apenas os de cor
amarelo.
Eu, que moro orgulhosamente – ainda seremos os primeirões - na
7ª cidade mais violenta do planeta, segundo a ONU, sugiro também a proibição do
uso capacetes aos motociclistas para melhor identificar matadores de aluguel,
assassinos e ladrões; ou ambos. Caso a medida não surta efeito, recomendo a sumaria proibição da produção,
comercialização e uso de motocicletas; não apenas as amarelas, mas as de
qualquer cor. Nessa mesma aldeia, aquela que quer por que quer ser chamada de presidenta
porque já foi estudanta e adolescenta, começou a ficar meio amarelenta; e bate
boca, como uma maloqueira, com
seus companheiros ex-camaradas de uma petroleira sobre um negocio
que amarelou. Logo serão inimigos desde criancinha. A coisa tá preta! Da cor do
petróleo. Talvez a solução para resolver o intrincado negócio será tocar fogo
em todos os sofás – sejam eles lá de que cores forem – do gabinete da
presidenta da petroleira. Graça de nome, apenas, ao contrário do que se vê. E muito,
muito aquém da bela mulher do homem que resolveu seu maior problema queimando o
sofá amarelo.
E o ferreiro? Bem o ferreiro continuou malhando o ferro e recebendo
novas encomendas da bela agradecida.
*Jornalista e Escritor