Há
um homem pelas ruas
Sérgio
Jockyman
Muitos
estiveram junto dele e não o viram. Muitos tocaram suas mãos e não o sentiram.
Muitos desejaram suas palavras, mas não o ouviram. Muitos juram que ele não
existe, mas há um homem pelas ruas. Ele estava na frente do povo na terça
feira. Ele subiu também as escadas, comandando a revolta. Ele rompeu as portas,
ele destruiu e queimou junto com o povo. Muitos falavam no seu nome, mas
ninguém o viu. Quanto muitos choravam eram dele as palavras de consolo. Só ele
sabia que a revolta também era um pranto. Só ele sabia que aquele povo que
depredou e destruiu estava apenas à procura de justiça;
Há
um homem pelas ruas. Um homem que sabe que foi melhor trocar fogo e destruição
por sangue e sacrifício. Onde estava ele? Andu pelas favelas de Recife, pelas
ruas estreitas de São Luiz, pelo asfalto do Rio, pelos arranha-céus de São
Paulo, pelas ruas de Porto Alegre. Quando o povo recuava diante dos fuzis e das
baionetas, ele sorria.
Há
um homem pelas ruas que não teme metralhadoras, que não teme fuzis, que não
teme baionetas.
Ele
estava na mira de todas as armas, mas inatingível para todas elas. Passou com
um sorriso pelos tanques, e com um sorriso tocou o cano das metralhadoras.
Detiveram o povo com fileiras de soldados, mas ele passou incólume por elas.
Há
um homem pelas ruas, que não poderá mais ser detido com exércitos.
Há
um homem pelas ruas, que não poderá mais ser preso ou sacrificado. Cautela com
ele. Ele deverá votar em todas as urnas do Brasil. Mesa por mesa, secção por
secção. Seus votos se multiplicarão e são uma garantia de vitória.
Há
um homem pelas ruas que vai ser o mais votado do Brasil. Embora as leis
eleitorais o proíbam, ele será candidato milhares de vezes para milhares de
postos. Seu nome figura nas listas de candidatos à Assembléia legislativa, mas
também nas listas de candidatos à Câmara Federal. Ele é candidato a todas as
cadeiras do Senado, a todos os governos estaduais do Brasil. Não há máquina
política, nem publicidade ciclópica que o possa vencer.
Há
um homem pelas ruas acima das leis, acima dos regulamentos. Ele vai despertar
um por um daqueles que um dia ouviram seu nome. E muito daqueles que
desgostaram seu nome, passarão a venerar a sua memória. Nenhum cabo eleitoral
distribuirá tantas cédulas quanto ele. Entre ricos e pobres, entre homens e
mulheres, entre jovens e velhos estará o se nome. Ainda existirá alguém que o
persiga. Mas por mais que procure, por mais que busque e investigue, não o
encontrará.
Cerrarão
as portas e assim mesmo ele entrará. Deixarão guardas, mas assim mesmo ele
passará. Dirão e escreverão que ele não é bom, mas ninguém creditará. E durante
muitos anos, aqueles que veneram o seu nome terão o poder e a glória.
Muitos
baterão no peito e dirão: eu fui seu amigo. Mas ele desvendará as intenções, e
todos os seus saberão que aqueles mentem. Embora ele sorria, os seus inimigos
tremerão. Ele deitou a confusão entre os que os procuravam e combatiam. E
quando disseram: ele não mais existe, ele os destruiu.
Há
um homem pelas ruas. Muitos poderão falar e aconselhar, pedir e admoestar, mas
só ele poderá dar ou tirar a ordem e a tranqüilidade. Não há bala que o atinja,
não há calúnia que o fira. Virão novos Presidentes, mas ele será o único
existente. Muitas vidas passarão, mas ele não perecerá.
Há
um homem pelas ruas além da vida, alem da morte, além do tempo. Há um homem que
descerrará os portões dos quartéis e sem uma palavra desarmará as mãos quem se
erguerem contra ele.
Há
um homem pelas ruas mais forte que exércitos, mais forte que leis, mais forte
que os Partidos, mais forte que laços de sangue, que sentimentos de pátria.
Chamava-se Getúlio Dornelles Vargas, hoje não se chama mais. Pode ter errado,
pode ter caído não uma, mas várias vezes, pode ter feito tudo o que dizem, tudo
o que ainda dirão, mas nada disso importará.
Há
um homem pelas ruas que se chamava Getúlio Dornelles Vargas, mas hoje não se
chama mais. Os que procuram um nome poderão dizer que ele é: revolta, justiça,
ideal, ação ou qualquer outra palavra. Mas, embora podendo ser tudo que dizem,
na verdade não o é. Os que o adoram, os que simpatizam com ele, os que o
lamentam, os que se apiadam dele não o vão recordar por ter sido Getúlio
Dornelles Vargas, não por ter sido Presidente do Brasil, não por ter sido
chefe de Partido, não por ter sido líder de qualquer coisa, mas simplesmente
por ter sido um homem.
Há
um homem pelas ruas...mais forte que o tempo, mais forte que a vida. Um homem
que se chamou Getúlio Dornelles Vargas, mas que não se chama mais. Chama-se
apenas: um homem.